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4 - O "raciocínio" é um instrumento de excelência que permite a organização, sistematização e estruturação das "coisas" (para englobarmos tudo o que é ideia e emoção, acto e situação) vindo todavia com a mesma problemática que afecta a modernidade. Procura justificar-se e bastar-se a si próprio, procura ser tanto causa como efeito, o motivo motor, a rota e a conclusão. Nenhuma motivação humana, nem uma, é de natureza racional - a razão analisa, não cria. Uma vez mergulhado a fundo na razão que o ignora, o ser humano está trancado e a chave fora deste idealismo, deste sistema, permanecendo inacessível.
5 - Este idealismo, ao contrário do que se possa pensar, faz parte do aspecto negativo da modernidade - aquele de se seguir luzes falsas. O idealismo dos dias de hoje é o informatismo que veio substituir o industrialismo dos dias de ontem. As ideias abandonaram a substância, não a possuem mais do que um placar electrónico, com uma paisagem paradisíaca e uma bela mulher nua. Estão a tentar distrair-nos para não escutarmos a voz das coisas, a voz dentro da voz dos que falam e do silêncio do que está calado - porque cantar a natureza dessas coisas, isso sim, e só isso, causaria uma verdadeira revolução para o estado (situação) moderno. Uma revolução, primeiro, em consciência e do indivíduo, e depois o mundo, com uma alma, abrir-nos-ia as portas.
6 (a) - Um exemplo das coisas tornadas em falsa substância, e da flagrância do truque moderno, está na consequência do movimento hippie - e associações de direitos humanos que batalhavam nessa época - pelas liberdades sexuais - nudez, sexo antes do casamento, amor homossexual, mais liberdade para a mulher, etc - hoje feito em reclames de TV e videoclips de venda, estampado em embalagens de tudo o que é consumível ao ponto do sufoco da dimensão profunda no que respeita ao assunto sexual, tornando-o mecânico e despido de significado. Antes, o significado de todas os objectos e, inclusive, de todos os sujeitos modernos, é estes serem consumíveis, ficando assim não menos virtuais que a moeda. De igual forma ao que explanamos respectivamente à tendência da razão, também o capitalismo se fecha nessa máxima, e procura ser tanto causa como efeito, o motivo motor, a rota e a conclusão.
6 (b) - Falando alegoricamente, e agora de um anjo como esfinge: A todos impõe um teste (sem sair ainda do campo da intelectualidade) - o da luz e o da escuridão, o de depois da luz ser escuridão enquanto depois da escuridão há luz. O caminho para o Éden só se abre de Noite, e esta é uma parábola dirigida aos idealistas.
6 (c) - Quando os ideais esquerdistas e os ideais liberais se expurgarem de todo o materialismo (mito e doutrina, nunca pedra e rio e pão), serão dignos do respeito dos sábios.
7 - Há no homem o ser-se bobo, e hoje começa a descobrir-se que não existe corte, indo então este homem à procura de rir-se de si próprio e ser bobo duas vezes, numa suposta ascese que desemboca em lado nenhum. Mas isto só os bobos, ou quase só os bobos, o sabem. O riso inútil será o maior obstáculo do niilista heróico, cargo que, na modernidade, tem sido semelhante ao do profeta.
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André Consciência