Miguel Jasmins Rodrigues
A História da presença portuguesa no Além-mar é paradoxal: é uma História que revela uma extraordinária força anímica e uma gigantesca capacidade de concretização, cabalmente demonstradas pela fundação do primeiro “império” global da História, com raízes ainda bem firmes quase meio milénio depois, mas é – paradoxalmente – uma história de fraqueza e de engenho, flexibilidade e improvisação em a ultrapassar.
Como bem escrevia Fernando Pessoa: “Portugal era um anão, com braços de gigante,, procurando abraçar o mundo”. Nem mesmo no zénite do processo da Expansão, Portugal teve, com efeito, os meios demográficos e financeiros para sustentar tal empresa. Desde cedo, devido a essas fragilidades, houve necessidade de conceder às parcelas mais remotas do império um grau de autonomia muito elevado, fundando o Vice-Reinado e concedendo grande liberdade aos capitães das praças mais longínquas, como Malaca ou Timor. A distância explica essa grande autonomia da presença no oriente, sendo do próprio oriente que partiam as expedições de socorro quando uma determinada praça ou fortaleza se encontravam em apuros: Lisboa estava a dois anos de distância e frequentemente não tinha uma ideia realista da situação local… foi assim que Malaca e Ceilão foram socorridas várias vezes diretamente por Goa e que, mais tarde, Luanda seria libertada dos holandeses por uma esquadra armada, guarnecida e diretamente comandada por colonos brasileiros…
A razão maior do sucesso e perenidade extraordinária da presença portuguesa no Oriente, de facto bem maior do que a de outras potencias bem mais nutridas, como a França e a Holanda, é a descentralização da administração local. Não somente no aspecto da administração política e militar, vertentes já apontadas no parágrafo anterior, mas até na constituição dos escalões intermédios e altos da administração, amplamente municiados por indígenas (caboverdianos em África e goeses no Oriente) e no exército. No campo militar, a formação de famílias mistas, incentivada por Albuquerque revelou-se fundamental para formar um estrato demográfico conhecido no Oriente como os “casados” que serviriam de comandantes militares e administrativos em todo o Oriente, chefiando forças de origem indígena que constituíam geralmente o grosso dos contingentes militares, sempre raros de tropas metropolitanas (afetadas pelas altas taxas de doença e deserção). Sem esta transferência da Defesa e da Administração para os povos locais, nunca teria sido possível manter uma presença em Goa até 1961 ou em Timor e África até 1975, tamanha era a desproporção de forças para com potentados e impérios locais e para com outras potencias europeias.
2 comentários:
Eis como de um defeito se pode fazer uma virtude...
ora bem! essa sempre foi a grande capacidade dos portugueses...
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