Trinta e seis personalidades apresentaram um manifesto contra a política energética. "Sem tabus", ameaçam. Excepto o tabu de dizerem ao que vêm: negócios para uns, política para outros e talvez algum renovável ressabiamento. O "Manifesto por uma..."
Trinta e seis personalidades apresentaram um manifesto contra a política energética. "Sem tabus", ameaçam. Excepto o tabu de dizerem ao que vêm: negócios para uns, política para outros e talvez algum renovável ressabiamento.
O "Manifesto por uma Nova Política Energética em Portugal" foi apresentado ontem por Mira Amaral, que encabeça a lista. Critica o excesso de subsidiação das renováveis - embora esteja basicamente a falar da eólica - e pede outras formas de produção - embora esteja basicamente a falar de nuclear.
Sim: nuclear, o tal tabu. Quem o defende desistiu de o afirmar, passou a insinuá-lo. Percebe-se a dificuldade: há preconceito e ignorância que são sempre jogados contra a energia nuclear. Mas não se percebe a camuflagem: por que não há-de este Manifesto assumir o que é? É um manifesto onde o lóbi nuclear se encontra com o PSD numa sala emprestada do Instituto Superior Técnico e arregimenta alguns anti-Sócrates que passam à porta.
Não há mal em defender o nuclear. Ou um negócio. Mas há mal em ser sonso. E incoerente: há quem tenha assinado este manifesto sem que a tinta com que assinou outro, contra as obras públicas, tenha secado. Sendo que o anterior está contra grandes projectos que aumentem o endividamento e as importações na sua construção e este está a favor de grandes projectos que aumentam o endividamento e as importações na sua construção. Central nuclear é importação pura, da concepção à construção. Talvez fosse uma maneira de compensar os franceses dos submarinos que preterimos.
O manifesto tem mais de enérgico que de energético. Diz quem sabe que está cheio de erros e falácias. Quem sabe? Sabe Jorge Vasconcelos, o maior insuspeito de "socratismo": saiu da ERSE levando de recordação uma caixa de alfinetes e um boneco "voodoo" de Sócrates. Pois bem, Vasconcelos já arrasou no "Público" a competência do Manifesto e as intenções dos que o assinam. Falando, sem nomear, de Sampaio Nunes ou de Valente de Oliveira, que estiveram em governos anteriores. Falando, sem nomear, de Francisco van Zeller, que agora está indignado com o custo das renováveis sobre as famílias mas que, como presidente da CIP, pressionou o Governo a isentar as empresas desse sobrecusto, remetendo-o... para as famílias.
Não é fácil avaliar uma política energética a partir de um manifesto preguiçoso e que se limita a estar contra. Não estamos a falar do TGV que se há ou não de fazer. Mas de investimentos em curso. Não há tabus, de facto. Há uma tábua rasa sobre 15 anos de política energética.
Portugal investe em energias eólicas e hídricas porque tem vento e rios, não tem petróleo. E são razões económicas - não ambientais - que movem a opção. Não é para salvar o mundo, é para substituirmos as importações de petróleo. Que, já agora, também é uma indústria altamente subsidiada. E quando o petróleo voltar a subir, com a retoma económica, as renováveis voltam a ser competitivas. Até lá, têm de ser subsidiadas.
Se queremos baixar os custos eléctricos das famílias, devíamos começar por olhar para aquela sopa da pedra que é a tarifa, que inclui 7% para autarquias e taxa do audiovisual. Mas não confundir as razões do défice tarifário, um tremendo erro para esconder subidas de preços que começou com as gasolinas, não com as renováveis.
O problema ibérico não é falta de centrais, mas o seu isolamento: não é uma península, é uma ilha energética, travada nos Pirinéus pelo proteccionismo francês. Há excesso de produção de água e vento na Ibéria. A EDP antecipou a descontinuação de centrais térmicas (como o Carregado), a Iberdrola desistiu da cogeração, há alturas em que todas as centrais térmicas do País estão paradas.
Se é de políticas energéticas que queremos falar, vamos a isso. Se é de negócios, vamos a isso. Se é outra coisa, então continuem a mandar postais.
Fonte: Jornal de Negócios
6 comentários:
Eu manifesto-me em favor da guilhotina nuclear - o machado fatiga muito, quando se trata de grupos...
Há um pequeníssimo número de portugueses que vive em Portugal como se Portugal fosse Lisboa e Lisboa fosse Nova Iorque...
Ora que grande texto. Os jornais especializados em economia e negócios são os que tratam mais impiedosamente da 'politica' - e isso merecia ser meditado.
è verdade, Jesus Carlos.
Como dizia o outro (lisboeta), lendo no jornal as queixas de um cidadão portuense sobre estarem em Lisboa os centros da administração pública: "esta gente está sempre a queixar-se; e eu, que tenho que ir a Nova York para despachar a maior parte dos meus negócios?"
Guilhotina!! ;)
Faz uma busca e lê os nomes das 36 personalidades...
Aquilo que sempre mais abominei nos comunas é não terem sabido aproveitar o 25 de Abril! Cravos nas espingardas?? Enfim, já estava tudo contaminado pela maconha capitalista... :)
Quem sabe um dos grandes males deste país é nunca ter tido uns «arrepios» nem de Esquerda a sério, nem de Direita a sério... Somos um povo tão «bonzinho»...
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