[…] Tenho lido muito, muito; desde há quatrocentos anos quase não faço outra coisa.
Por um lado, a leitura distrai-me, leva-me a esquecer a cadeia; por outro, tortura-me, pois é pelos livros dos homens que eu vejo, sobretudo o drama que criei… Ultimamente, lá no manicómio, só queriam dar-me livros optimistas, livros em prol. Os médicos afirmavam que essas obras não me despertariam ideias sombrias… Mas eu protestei imediatamente…
– Ah, o senhor esteve no manicómio? – perguntei, de modo tímido.
– Estive – respondeu-me ele, com naturalidade. – Não tenha medo de me ofender, pois desde o princípio adivinhei que o senhor pensa que eu sou louco. Não me ofende nada… Todos têm pensado de mim a mesma coisa, já lhe disse. Estive e lá estaria ainda se, ontem, não tenho conseguido fugir. Estava lá ia já para oito anos. E sabe porquê? Porque, um dia, entrei numa igreja e gritei aos crentes que se encontravam ajoelhados: «Não vos resigneis, pois o mundo que eu fiz é muito imperfeito e, portanto, precisa mais do vosso esforço do que da vossa resignação. Imperfeito há-de ele ser sempre e vós também; contudo, em muita coisa podeis aperfeiçoar o mundo e a vós próprios. Mas não é de joelhos que o fareis; é de pé e a lutar! Quem vos fala já foi Deus e sabe por que fala assim…» […]
Ferreira de Castro in O Senhor dos Navegantes, Colecção 98 Mares – Expo'98, Lisboa, 1998
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"Trata-se, actualmente, de poder começar a fabricar uma comunidade dos países de língua portuguesa"
Nenhuma direita se salvará se não for de esquerda no social e no económico; o mesmo para a esquerda, se não for de direita no histórico e no metafísico (in Caderno Três, inédito)
A direita me considera como da esquerda; esta como sendo eu inclinado à direita; o centro me tem por inexistente. Devo estar certo (in Cortina 1, inédito)
Agostinho da Silva
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