Santo Agostinho, Sandro Botticelli, 1480
A esfera armilar é um complexo sistema de transferência de graus. Após a invenção do sextante, que calculava a declinação dos astros em relação ao horizonte marítimo, e da linotipo que imprimia tábuas de logaritmos para uso em navegação, o instrumento caiu em desuso e passou a ser usado somente como produto de decoração ou status.
Fonte: Esfera Armilar.
Os sensacionistas portugueses são originais e interessantes porque, sendo estritamente portugueses, são cosmopolitas e universais. O temperamento português é universal; esta, a sua magnífica superioridade. O acto verdadeiramente grande na história portuguesa – esse longo, cauteloso, científico período dos Descobrimentos – é o grande acto cosmopolita da História. Nele se grava o povo inteiro. Uma literatura original, tipicamente portuguesa, não o pode ser porque os portugueses típicos nunca são portugueses. Há algo de americano, com a barulheira e o quotidiano omitidos, no temperamento intelectual deste povo. Ninguém como ele se apropria tão prontamente das novidades. Nenhum povo despersonaliza tão magnificamente. Essa fraqueza é a sua grande força. Esse não regionalismo temperamental é o seu inusitado poder. É essa indefinidade de alma que o define.
Porque o facto significativo acerca dos portugueses é que eles são o povo mais civilizado da Europa. Eles nascem civilizados porque nascem aceitadores de tudo. Neles nada há do que os antigos psiquiatras costumavam chamar misoneísmo, o que significa apenas ódio às coisas novas; gostam francamente de mudar e do que é novo. Não possuem elementos estáveis, como os franceses, que só fazem revoluções para exportação. Os portugueses estão sempre a fazer revoluções. Quando um português se vai deitar faz uma revolução porque o português que acorda na manhã seguinte é diferente. É precisamente um dia mais velho, um dia mais velho sem dúvida alguma. Outros povos acordam todas as manhãs no dia de ontem; o amanhã está sempre a vários anos de distância. Mas não esta tão estranha gente. Move-se tão rapidamente que deixa tudo por fazer, incluindo ir depressa. Não há nada menos ocioso do que um português. A única parte ociosa do país é a que trabalha. Daí a sua falta de evidente progresso.
Álvaro de Campos, O Sensacionismo (excerto), 1916, in Fernando Pessoa, Textos de Intervenção Social e Cultural, A Ficção dos Heterónimos, introdução, organização e notas de António Quadros, ed. Europa-América, Lisboa, 1986, p. 84 (original em inglês, tradução de J. Monteiro-Grillo).
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