Parece realmente bizarro que,
nos Estados Unidos da América, a Barack Obama tenha sucedido Donald Trump, e
que agora no Brasil a um longo consulado do PT (Partido dos Trabalhadores),
liderado por Lula da Silva, suceda Jair Bolsonaro. A lógica da pendularidade
histórica decerto que explica em parte o fenómeno, mas não explica tudo. Desde
logo porque os EUA e o Brasil são realidades muito diversas. Ainda assim, há
algumas similitudes entre estes dois casos.
Recentemente revi, pela
enésima vez, o filme “O Caçador”, de Michael Cimino (decerto, ainda hoje, um
dos melhores retratos da chamada “América profunda”), e, ao longo do filme,
fui-me perguntando: se aquelas personagens tivessem votado nas últimas eleições
nos EUA, quantas teriam escolhido Hillary Clinton? Nenhuma delas, concluí
(incluindo, saliente-se a ironia, a personagem de Robert de Niro, o herói da
história). E não é porque fossem “más” pessoas. Bill Clinton gostava de dizer
“it’s the economy, stupid”, mas essas eleições provaram precisamente o
contrário. Mais do que questões económicas, foram questões culturais. A maioria
“branca” (ou “WASP”) americana fartou-se da infinita agenda reivindicativa das
várias minorias.
No Brasil, algo de similar se
passou e Jair Bolsonaro, na sua não menos infinita brutalidade, intuiu isso
muito bem ao vociferar em plena campanha: “Tudo é coitadismo. Não pode ter política para isso. Coitado do negro, do
gay, das mulheres, do nordestino, do piauiense, tudo é coitadismo no
Brasil. Isso não pode continuar
acontecendo”. Sendo que, no caso brasileiro, houve outros factores, tão ou mais
relevantes: o da corrupção e (mais ainda, diria) o da criminalidade. Decerto
que em Portugal – um dos países mais seguros do mundo – é difícil de compreender
o fenómeno, mas no Brasil há muita gente com medo de sair à rua, sendo que esse
sentimento generalizado de insegurança não é um mero fantasma.
Por fim, há um outro factor não, de todo, negligenciável: o da Venezuela.
Em Portugal, todos temos acompanhado o que lá se tem passado, sobretudo por
causa dos muitos emigrantes portugueses, mas, naturalmente, acompanhamos de
longe. Ora, no Brasil, o (contra-)exemplo venezuelano não é igualmente um mero
fantasma e causou muita mossa no PT, que sempre defendeu, em todas as
instâncias internacionais, o regime de Chávez e de Maduro. Duvidam? Façam então
uma sondagem junto dos emigrantes portugueses na Venezuela (aos que já saíram e
aos que ainda lá estão) e perguntem-lhes se, em Portugal ou no Brasil, estariam
dispostos a votar em partidos apoiantes do cada vez mais decadente regime
venezuelano. Não custa adivinhar quais seriam as respostas (maximamente
negativas). E, também aqui, não é decerto por serem, em geral, “más” pessoas.
Renato
Epifânio
Presidente
do MIL: Movimento Internacional Lusófono
www.movimentolusofono.org
3 comentários:
Caro Presidente do MIL
Estimado amigo Renato Epifânio
Foi com alívio ler o texto sobre o Brasil, com o qual concordo e esperava outra versão saudável sobre a realidade exposta, que devemos todos ponderar, sem alcunhar ou rotular o presidente eleito pelos os brasileiros. Respeitar e um ato da "chamada democracia"
Chega de tantos comentários negativos julgando, sem "tentar compreender" (citando) e muito bem.
Cabe aos portugueses, ao invés de estarem de costas voltadas para o Governo, como se tudo esteja bem e num mar de rosas, neste País à beira mar plantado, devem sim "tentar compreender" os males da governação que não desejamos, como um povo que se honre dos seus valores, que se devem manter para além das nossas fronteiras, como contributo da pluralidade.
Abraço fraterno
"Questões económicas"! Foram questões económicas. Não culturais. Ambos, Trump e Bolsonaro, como Hitler tinha feito, desviaram o cerne do problema (económico - exploração desenfreada do povo) para questões culturais, dividindo os povos, exacerbando quanto puderam as contradições no seu seio, que sempre existem. Os três foram eleitos pelo povo (parte dele) nessa base. A riqueza dos mais ricos quer nos EUA quer no Brasil tem aumentado assustadoramente nos últimos 30 anos. É o que eu penso.
Ainda estamos longe de compreender o que, de fato, aconteceu nas eleições presidenciais no Brasil. Aparentemente, a democracia determinou a vitória do tosco e da barbárie sobre a delicadeza e sobre a humanidade. Mas, terá sido isto? Não sabemos o alcance e a profundidade alcançada pela manipulação das chamadas mídias sociais (especialmente o whatzapp) com o farto uso de recursos ilegais. Da minha parte, não acredito que, dado o nível de comprometimento politico do poder judiciário brasileiro, as investigações abertas pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) levem a alguma conclusão. Vamos ver como a população, especialmente a mais necessitada (aquela chamada pelo presidente eleito), vai reagir ao modo de governar do Capetão....
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