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MIL: Movimento Internacional Lusófono | Nova Águia


Apoiado por muitas das mais relevantes personalidades da nossa sociedade civil, o MIL é um movimento cultural e cívico registado notarialmente no dia quinze de Outubro de 2010, que conta já com mais de uma centena de milhares de adesões de todos os países e regiões do espaço lusófono. Entre os nossos órgãos, eleitos em Assembleia Geral, inclui-se um Conselho Consultivo, constituído por mais de meia centena de pessoas, representando todo o espaço da lusofonia. Defendemos o reforço dos laços entre os países e regiões do espaço lusófono – a todos os níveis: cultural, social, económico e político –, assim procurando cumprir o sonho de Agostinho da Silva: a criação de uma verdadeira comunidade lusófona, numa base de liberdade e fraternidade.
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NOVA ÁGUIA: REVISTA DE CULTURA PARA O SÉCULO XXI

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"Trata-se, actualmente, de poder começar a fabricar uma comunidade dos países de língua portuguesa"

"Trata-se, actualmente, de poder começar a fabricar uma comunidade dos países de língua portuguesa"

Nenhuma direita se salvará se não for de esquerda no social e no económico; o mesmo para a esquerda, se não for de direita no histórico e no metafísico (in Caderno Três, inédito)

A direita me considera como da esquerda; esta como sendo eu inclinado à direita; o centro me tem por inexistente. Devo estar certo (in Cortina 1, inédito)

Agostinho da Silva

quarta-feira, 21 de junho de 2023

Entre Eduardo Lourenço, José Marinho e Agostinho da Silva


 

Sendo, desde logo, o nosso descentramento de cariz espacial, geográfico – daí a nossa “situação finistérrea” –, ele é também, senão sobretudo, um descentramento de cariz temporal, histórico. Como escreveu José Marinho, esse descentramento histórico é de tal modo acentuado que “nos pensadores de maior consciência teorética ou especulativa, emerge o pensamento português alheio ao tempo da modernidade”.

Para muitos, justifica-se esse desfasamento pelo nosso proverbial “atraso”. Para esses, estranho seria, aliás, que, estando Portugal “atrasado” em relação aos mais “avançados” países da Europa nos mais diversos domínios, não o estivesse também no domínio da filosofia. Para esses, a par de um défice económico, social e político, deve pois mencionar-se um défice cultural, senão mesmo civilizacional, que, por sua vez, se consubstancia num alegado défice filosófico. Eis, em suma, a opinião mais generalizada e, dir-se-ia, a mais “sensata”.

Não propriamente por ter “prazer em discordar” – prazer esse que, aliás, assumiu não ter – não é essa, contudo, a visão de Marinho. Daí, desde logo, esta sua dúvida, esta sua interrogação: se Portugal, enquanto essa “região espiritual, a mais agudamente cristã da Europa, que os nossos ‘inteligentes’ desde Luís António Verney vêm considerando a mais atrasada, a mais improgressiva (…), não será, noutro sentido, a mais adiantada, a que primeiro tentou a grande aventura da terra, esgotou os caminhos e ficou à espera que a experiência humanista chegasse à nova encruzilhada”.

Ensaiemos aqui defender essa perspectiva. Não porque, em certos domínios, a situação de Portugal não seja de “atraso”, ou, pelo menos, de “desfasamento”. No entanto, esse “desfasamento” pode, desde logo pela distância que gera, fazer emergir uma visão mais funda. Eis, ainda, o que José Marinho expressamente defende – nas suas palavras: “Separados dos caminhos da Europa, o que não é coisa a lamentar liricamente ou a verberar polemicamente, os portugueses têm por vezes sinais inequívocos do que pelo mundo vai.”. Nessa medida, esse nosso “desfasamento” não tem, pois, que ser visto como uma “insuficiência” ou como uma “impotência”, mas como algo que nos pode – sublinhe-se, o “pode” – fazer ver mais fundo, mais longe…

Eis, desde logo, segundo José Marinho, o caso, exemplar, de algumas das teses de Sampaio Bruno – nas suas palavras: “Pode e deve dizer-se que o nosso filósofo antecipa com seu pensar ao mesmo tempo difuso e concentrado, algumas das formas mais autênticas da filosofia e dos caminhos da nossa época.”; “Como para todo o pensamento europeu desta nossa era, resultava imperioso para a filosofia portuguesa levar ao limite o sentido da negatividade. Tal foi a façanha decisiva de Sampaio Bruno.”. Quem conhece a sua obra, sabe o que Marinho entende por este “levar ao limite o sentido da negatividade”: trata-se, precisamente, de extremar a “cisão extrema” – a cisão, a “situação de extrema separatividade [do homem] em relação a Deus e à Natureza”, e a si próprio –, dado que só assim, na extremação da cisão, será possível potenciar a “união cumulativa” entre “Deus”, a Natureza e o homem.

Ainda que por outros motivos, não considera igualmente Álvaro Ribeiro que o pensamento brunino esteja ultrapassado – ao invés, defendeu que “o pensamento filosófico de Sampaio Bruno, longe de ser retardatário ou anacrónico, pertence à nova idade que contamos a partir de Kant”. A mesma consideração estende, aliás, a toda a “filosofia portuguesa” – nas suas palavras: “Afastados da Europa Central, por situação geográfica e por missão histórica, desatentos à aurora e ao crepúsculo da filosofia ‘moderna’, (da Renascença ao Iluminismo), talvez os portugueses preservassem dessa maneira uma qualidade oculta mas original; assim, o que na linha internacional parece marcha retardatária, talvez possa ser interpretado como fidelidade nobilíssima, se não como astúcia antevisora.”.

Eis, igualmente, a perspectiva de Agostinho da Silva: não devemos lamentar esse “desfasamento”, dado que é ele que nos “salvaguarda” e que pode vir, inclusive, a reorientar a Europa, todo o Ocidente – nas suas palavras: “…quando a técnica tiver esgotado todas as suas possibilidades, quando a economia protestante se verificar plenamente anti-humana, quando a centralização estatal se revelar estéril, Portugal virá de novo construir o seu mundo de paz, por maior que tenha de ser o seu sacrifício: mundo de uma paz que não surja como a Romana ou a Inglesa, do exterior para o interior, de um César para os seus súbditos, dos tribunais para os corpos; paz que se realize antes de tudo nas almas, lei que seja inteiramente não escrita e, no melhor de si, informulada; Reino de Deus que surja pela transformação interior do homem.”. Na perspectiva de Agostinho, eis, aliás, a “missão” – ou, melhor dizendo, a “acção” – pela qual se cumpririam, enfim, as Descobertas.

Crítico impiedoso deste tipo de perspectivas foi Eduardo Lourenço. Daí, a título de exemplo, a sua reiterada denúncia do “irrealismo prodigioso da imagem que os portugueses fazem de si mesmos”, “irrealismo” esse que, alegadamente, se consubstancia nos diversos “mitos compensadores da nossa frustração de antigo povo glorioso, como o de um Quinto Império, que terá em Fernando Pessoa a sua expressão mais acabada”, consubstanciação essa que o nosso pensador explica desta forma “psicanalítica”: “Portugal tem uma hiperidentidade porque tem um défice de identidade real. Como tem um défice de identidade, compensa-a no plano imaginário.”. Ainda assim, não deixou o autor d’ O Labirinto da Saudade de antever nesse nosso tão proclamado “atraso” um alcance outro, capaz inclusivamente de fazer com que a Europa se reencontre consigo própria, acto através do qual Portugal, alegadamente, se reconciliaria, enfim, consigo mesmo.

Se, para Eduardo Lourenço, as circunstâncias que explicam o nosso “atraso” são também aquelas que “nos tornaram imunes, ou mais imunes que outros, à tentação niilista”, para Miguel Real, analogamente, esse é um “atraso”, um “defeito”, com virtualidades positivas – daí, a título de exemplo, estas suas palavras: “A virtude deste ‘defeito’ poderá ser actualmente postulada como diferença positiva, não enquanto uma barreira ao imperialismo da world culture americana do fast food e da fast live, mas como uma alternativa humanística, generosa, tolerante (a famosa ‘Espanha das Três Religiões’), como se pudéssemos oferecer ao mundo uma forma de vida baseada numa lenteur, que se adapta aos ritmos e tessituras ambientais e que secundariza o progresso técnico em nome de um estado de vida ocioso. À vitesse americana e japonesa como padrão universal de comportamento, a nossa diferença permite-nos saborear a vida como uma lenteur espessa (…), que, aspirando ao melhor que a Europa tem (qualidade de vida), não suga dela o industrialismo sem sentido esgotador de recursos e esbanjador de mercadorias.”.

Tal como estes dois pensadores, também José Marinho anteviu nesse nosso “atraso” um alcance outro, que não só nos tornou “mais imunes à tentação niilista”, como, cumulativamente, nos abriu um outro Horizonte. Como nos adverte, nada está, porém garantido – “tudo depende de filosofarmos”: “A situação de Portugal se afigura pior num sentido e noutro sentido melhor que a dos povos de além-Pirenéus. Pior, porque nos faltou e falta o processo de desenvolvimento científico com tudo quanto o acompanhou, com a experiência e gradual reflexão que lhes foi própria, dos povos nossos irmãos mais próximos dos quais nos distanciámos. Melhor porque, justamente por nos ter mantido na obstinada fidelidade ao que foi, se torna possível, com a cisão extrema para todo o passado, na floresta de maravilhas e terrores a que a Europa veio e para a qual arrasta o mundo, uma perspectiva diversa e complementar, e talvez não menos funda, ou não menos lúcida que a deles. Tudo depende evidentemente de filosofarmos e das condições de filosofarmos.”. Estaremos, contudo, de facto disponíveis para isso?, para nos pensamos na nossa “situação”?

2 comentários:

Nova Águia disse...

Amigo,
Parabéns pelo texto sobre Lourenço, Marinho e Agostinho.
Forte abraço.
Miguel Pedrosa Machado

Carlos Vargas disse...

Meu caro amigo,
Felicito-te pela excelência do texto.
Parabéns
Carlos Vargas