A ocupação simbólica das Ilhas Selvagens por independentistas das Canárias poderá ter tido um efeito inesperado. Com efeito, cerca de uma semana depois, ou nem tanto, num programa de televisão ("sexta às nove", do dia 26 de setembro de 2014), de forma algo inesperada, surgiam, pela primeira vez em muitos anos, declarações do Ministério dos Negócios Estrangeiros, inequívocas, sobre um litígio com Espanha em torno de Olivença. Afinal, talvez Lisboa possa responder às pretensões espanholas sobre as águas das Selvagens com um outro motivo de queixa (e de litígio). Poderá tratar-se de coincidência, mas as afirmações foram bem claras.
Vimos (e ouvimos) a jornalista Sandra Felgueiras afirmar que [havia] «um conflito latente com Espanha, em torno da cidade de Olivença.». As imagens procuravam comprová-lo, revelando a recusa portuguesa de reconhecer a fronteira no Guadiana, em frente a Olivença, não existindo marcos fronteiriços na região por essa razão. Mais à frente, Maria Manuela Falcão a partir do Ministério dos Negócios Estrangeiros, como membro da Comissão de Limites (agora denominado CILCH , declarou que [é] «uma zona, portanto, que ainda não está delimitada, e que, segundo a Constituição da República Portuguesa...refere que Portugal é constituído pelos territórios historicamente definidos no continente europeu e pelo arquipélago... os arquipélagos dos Açores e da Madeira. Portanto, nós não reconhecemos a soberania territorial de Espanha sobre esse pedaço de linha de fronteira.»
A afirmação mais clara partiu do embaixador Rui Lopes Aleixo, Presidente de Comissão de Limites (CILBH), que, a partir do Ministério dos Negócios Estrangeiros, confrontado com alguma ignorância do público e mesmo de responsáveis autárquicos locais sobre esta velha reivindicação portuguesa, disse [ser] «uma regra diplomática, designadamente em termos de negociações de fronteiras, aquilo que não se pode resolver não se aborda. (...) em benefício das relações entre os dois países, (...) mas, quando eu digo isto, não quer dizer que Portugal tenha prescindido dos seus direitos, reconhecidos aliás, pela Espanha (...) em 1817 (...) dos seus direitos sobre o território de Olivença, Portugal não prescinde desse direito, não prescinde de reivindicar esse direito»
Estas afirmações, claras, pecam por timoratas e tardias, ainda que oportunas. Sabemos, porém, agora, que Portugal tem algo a contrapor a Madrid no que toca a reivindicações bilaterais. Sabemos que há cautelas, ao contrário do que sucede com Espanha que, pensando ter razões de queixa em relação a Lisboa, não hesita em recorrer diretamente à ONU.
Ficamos a saber muito sobre a Diplomacia portuguesa. Mesmo muito...
Augusto António Amado
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