Já tem sido mil e uma vezes denunciado (nomeadamente, por José
Pacheco Pereira), mas nem por isso é excessivo insistir: os nossos “media”, em
geral, tendem a noticiar sobretudo o que parece confirmar as “narrativas” que
eles próprios criam. Exemplo paradigmático disso tem sido, na Europa, o
fenómeno do “Brexit” – narrativa: os britânicos enganaram-se (ou foram
enganados, conforme as versões); logo, noticia-se sobretudo o que pareça
confirmar esse “engano”.
Sobre esse e outros fenómenos falámos longamente com o novo
Ministro da Educação do Brasil, Ricardo Vélez-Rodriguez, que participou em dois
eventos em Lisboa, recentemente promovidos pelo Instituto de Filosofia
Luso-Brasileira, que ambos integramos: XII Colóquio Tobias Barreto, sobre
“Historiografia e Hermenêutica da filosofia luso-brasileira”, e um Congresso
sobre “O krausismo ibérico e latino-americano”.
Sem ilusões nem lamentações, Ricardo Vélez-Rodriguez constatou
igualmente como o mesmo se tem passado com o Brasil. “Vocês não percebem o que
se tem passado no Brasil” - reiterou. Chegou até a dar o seu exemplo pessoal,
no que respeita ao fenómeno da (in)segurança: ele próprio esteve na iminência
de ser raptado, conjuntamente com a sua filha menor, o que o levou a abandonar
o Rio de Janeiro. No plano académico, deu também conta de como projectos filosóficos
seus eram sistematicamente boicotados por preconceitos ideológicos.
Não admira por isso que os “media” no Brasil estejam a apresentar Ricardo
Vélez-Rodriguez como “um desconhecido”. Em Portugal, pelo menos, não o deveria
ser. Ricardo Vélez-Rodriguez é um dos maiores estudiosos da filosofia
luso-brasileira, com vasta obra publicada. Sendo que, obviamente, por cá também
(quase) ninguém o conhece… Não conseguimos antecipar como será o próximo
Governo do Brasil chefiado por Jair Bolsonaro. No plano das relações com
Portugal e os restantes países lusófonos, Jair Bolsonaro tem sido completamente
omisso. De algo, porém, estamos certos,
conhecendo, como conhecemos, Ricardo Vélez-Rodriguez: pelo menos na pasta
(fundamental) da Educação, teremos alguém que muito preza as relações culturais
luso-brasileiras.
Saudamo-lo, pois, fazendo-lhe desde já o seguinte repto: nos
programas de História no Brasil, nos vários graus de ensino, Portugal continua
a ser, por grosseiro enviesamento ideológico, mais do que diabolizado, a ponto
de se sugerir, nalguns casos de forma muito pouco tácita, que tudo o que existe
de mau no Brasil decorre ainda da “herança colonial portuguesa”. Fazemos pois
votos para que o seu modelo de um ensino não ideologicamente enviesado leve
também à desconstrução desse embuste. Como Ricardo Vélez-Rodriguez bem sabe, o
Brasil só terá real futuro quando superar por inteiro esse complexo edipiano em
relação a Portugal. O próprio futuro da Lusofonia disso depende. Estamos igualmente
certos de que, na sua pasta, Ricardo Vélez-Rodriguez tudo fará para a promoção
da convergência, a todos os níveis, entre os países de língua portuguesa.
Renato Epifânio
Presidente
do MIL: Movimento Internacional Lusófono
2 comentários:
Muito bem!
Claramente
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