Duas missas, uma delas em português, assinalam na quarta-feira o Natal da comunidade católica de Goa, na Índia. À meia-noite é celebrada em concani a “missa do galo”, na Igreja Matriz de Nossa Senhora da Conceição, em Pangim, capital do estado de Goa, devendo a eucaristia das 10h30 ser rezada em português, como acontece todos os domingos nesse templo
“No que diz respeito às celebrações natalinas, perdura o mesmo espírito católico de antanho, embora, como em toda a parte, algo comercializado”, disse à agência Lusa Óscar Noronha, residente em Pangim, onde nasceu há 59 anos, quando a antiga colónia portuguesa já estava integrada na então União Indiana, desde 1961.
Para este goês, um divulgador da língua e da cultura portuguesas, “a ‘missa do galo’ é fator ‘sine qua non’” dos festejos natalícios.
“Existe só esta igreja em Goa onde se pode ouvir missa em português. Participo nela com a minha família e fazemos parte do coro, como vinham fazendo também os nossos pais”, afirmou.
A Igreja da Senhora da Conceição foi construída no século XVII, no lugar de uma ermida primitiva implantada, em 1541, na encosta poente do Monte Conceição, virada para a foz do rio Mandovi, no oceano Índico.
Nas casas de Óscar Noronha e demais católicos de Goa, “a nível doméstico, também não faltam o presépio, a estrela pendurada nos alpendres e a música natalina, bem como a consoada, que se refere aos típicos doces goeses, e as reuniões familiares”.
“A nossa gastronomia natalina é rica e maioritariamente goesa, constituída por pratos típicos, como o peixe com maionese ou o balchão, o sarapatel, a cabidela, a galinha cafreal, o ‘xacuti’ de galinha, a leitoa assada e o arroz refogado, entre outros”, descreveu o investigador e professor universitário de língua inglesa.
Como sobremesa associada ao Natal, destacou o doce de grão, o ‘neureô’, o dodol, a cocada, o ‘manddaré’, as teias de aranha, o ‘cormolam’ e a bebinca, “rainha dos doces” nos antigos territórios de Goa, Damão e Diu, administrados por Portugal como “estado da Índia”, até 1961.
“Julgo que, pelo menos hoje em dia, somente as famílias que, tradicionalmente, vieram apreciando a gastronomia portuguesa terão na sua ementa pratos como bacalhau, feijoada, vinhos do Porto e de mesa, ou doces como o ‘sans rival’ e o bolo-rei”, adiantou.
Óscar Noronha é irmão do multi-instrumentista Orlando Noronha, que toca guitarra portuguesa em espetáculos de fado e mandó, um género musical popular de Goa que pode ser cantado e dançado.
Este ano, o docente fez a primeira tradução de concani para português do hino “Sam Franciscu Xavier”, em honra do missionário jesuíta Francisco Xavier (1506-1552), que está sepultado na Basílica do Bom Jesus de Goa.
“É um hino tradicional de Goa. Dizem que data do século XIX, mas tenho um palpite que seja mesmo do século XVII”, admitiu.
A partir dos anos de 1880, porém, o compositor Raimundo Barreto (1837-1906) passou a ser considerado “o autor do mais comovente hino local, que ainda hoje fala ao coração do goês, tanto em Goa como na diáspora”.
“Em dezembro de 1961, houve romarias à velha cidade de Goa para pedir ao santo que salvasse Goa das mãos da União Indiana, mas não se realizou o pedido”, referiu Óscar de Noronha.
No dia 01 de dezembro, a versão do hino em concani teve estreia em Pangim, durante uma novena a São Francisco Xavier, com interpretação pelo coro da Igreja Matriz.
“A tradução será pelo menos um pequeno contributo à história da comunidade cristã de Goa”, disse.
Na década passada, fundou a editora Third Millennium, tendo publicado livros em português, inglês e concani.
Óscar Noronha divulga ainda a cultura indo-portuguesa através de um blogue pessoal e no Youtube, sendo também editor associado da Revista da Casa de Goa, que se publica em Lisboa. In “Bom dia Europa” Luxemburgo com “Lusa”
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