A
partir de um “estudo experimental feito com 40 estudantes universitários
portugueses”, pretendeu-se provar cientificamente que Portugal é o país mais
racista da Europa (cf. PÚBLICO, 02.09.2017). Tal acusação não chega a ser grave
porque é simplesmente absurda. Qualquer pessoa que conheça minimamente a Europa
sabe que assim é.
No mesmo estudo, a par do ranking do “racismo biológico”, onde
aparecemos em primeiro lugar, publica-se um outro ranking sobre o que se designa de “racismo cultural”, ou seja, como
nos é dito, sobre a percentagem da “população que acredita que há culturas
melhores”. Neste outro ranking não
estamos “tão bem” classificados – aparecemos “apenas” em quinto, atrás da Noruega,
Dinamarca, República Checa e Grã-Bretanha – mas, ainda assim, o absurdo
mantém-se, aqui, desde logo, ao nível das premissas do estudo.
Apenas um exemplo: se nós
dissermos que historicamente há culturas que foram menos potenciadoras de
atitudes racistas (como a cultura lusófona) e as valorizarmos por isso, desde
logo em relação àquelas que, pelo contrário, propiciaram mais atitudes racistas
(como a cultura bóer, na África do Sul), estaremos, ao fazê-lo, a ser racistas,
ou seja, a dizer que, neste âmbito, há culturas melhores do que outras.
Tal posição é, de resto, não
apenas absurda do ponto de vista lógico, como no plano legal. Apenas mais um
outro exemplo: como se sabe, há culturas que não apenas toleram como incentivam
a prática da excisão genital feminina, prática ilegal em Portugal e em muitos
outros países. Pois bem: à luz deste estudo e para não corrermos o risco de
sermos considerados racistas, teríamos que defender que as culturas que não
apenas toleram como incentivam a prática da excisão genital feminina não são
piores ou melhores do que as outras. Difícil, com efeito, imaginar um absurdo
maior.
Uma palavra final quanto à
pretensa cientificidade do estudo: o conceito de ciência é, a par do de
democracia, o conceito mais prostituído da nossa contemporaneidade. Tal como se
aplicou o termo de democrático aos regimes mais anti-democráticos, também o
termo científico caucionou historicamente as maiores aberrações. Para não sair
desta temática do racismo: ainda não há muito tempo, proliferaram estudos
pretensamente científicos a caucionar a alegada inferioridade de algumas raças.
O que não é difícil: com amostras de quarenta pessoas (estudantes
universitários ou não), pode-se “provar” tudo o que queiramos.
Renato
Epifânio
Presidente
do MIL: Movimento Internacional Lusófono
www.movimentolusofono.org
6 comentários:
Muito bom!
Cada vez mais a "prova científica" e a universidade se degrada?...
Ainda ando chocada e com nojo de ter lido, que pretenderiam incluir no próximo recenseamento a raça de todos nós. Que asco!
Agora sei o que é viver num país racista. E sinto nojo!
Se o disparate for para a frente respondo 'outro', 'mestiça' ou 'indefinido'. Algo que seja eficiente para boicotar o disparate.
Já me tinham falado, há tempo, que existiam verbas na UE para combater o racismo.
Já se estará a ver o problema Racismo, a ser para tal inventado?
AbraçoMIL
Por mais absurda que seja a pesquisa mencionada, continuo a não ter dúvidas de que o racismo e a xenofobia são uma realidade em Portugal e em toda a Europa.
Qual o problema de incluir a "raça" nos recenseamentos? Pronto ok "raça" não existe mas mesmo assim teremos a oportunidade de conhecer melhor o nosso Povo seja ele de que cor for.
Ab
O tal mundo em que "a raça não existe" mas onde tanto se fala de raças... Não fosse patético e triste seria anedótico e imbecil.
Não há que se falar em raças. O termo raça, servirá para cachorros, cavalos e afins. Há que se falar em ETNIAS. E não sejamos hipócritas, pois, no mundo inteiro, independentemente de "pesquisas científicas" ou "não científicas", há discriminação étnica entre quaisquer "etnias rivais", isto há.
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