Ainda na esteira da sua
premiada obra “Portugal. Ser e Representação” (1995), Miguel Real tem, na
última década, para além de outros estudos mais específicos (sobre diversos
temas e autores) e de vários romances, desenvolvido uma série de visões
panorâmicas sobre Portugal, sobretudo numa dimensão histórico-cultural, dignas
do maior realce. Falamos, nomeadamente, de “A morte de Portugal” (2007), “O pensamento
português contemporâneo 1890-2010” (2011), “Introdução à cultura portuguesa”
(2011), “A vocação histórica de Portugal” (2012), “Portugal, um país parado a
meio do caminho” (2015) e, mais recentemente, “Traços fundamentais da cultura
portuguesa” (2017).
Sem que isso denote uma
qualquer obsessão, em todas estas obras Miguel Real tem desenvolvido uma visão
cada vez mais sólida sobre a nossa situação histórico-cultural. Não temos a
menor dúvida, tanto quanto é possível não ter dúvidas neste plano, que, no
futuro, quem quiser compreender como era a nossa situação histórico-cultural,
terá, nesta série de obras de Miguel Real, um olhar de referência, que não
pode, de todo, ser ignorado, por mais que, naturalmente, possamos discordar de
algumas das suas teses, algumas das quais assumidamente polémicas.
A capa do livro é, desde logo,
particularmente sugestiva e informativa – para além, naturalmente, do título e
do nome do autor, ela traz uma série de palavras-chave que dão bem conta do
teor da obra – por ordem (sendo que aqui a ordem nos parece aleatória):
Saudade, Viriato, Decadência, Padre António Vieira, Lusofonia, Europa,
Marranismo, Fernando Pessoa, História Mítica, Canibalismo Cultural,
Estrangeirados. Sendo que a série se estende ainda à contra-capa: Quinto
Império, Agostinho da Silva, Jesuítas, Declínio, Antero de Quental, Esfera
Armilar, António Quadros, Eduardo Lourenço, Estado Novo, Alexandre Herculano,
António José Saraiva, Sebastianismo, Marquês de Pombal, Manuel Laranjeira, Sá
de Miranda. Seria, com efeito, difícil escolher uma melhor série de palavras-chave.
Não sabemos se foi por acaso,
mas não podemos deixar de realçar que o termo que aparece mais próximo do nome
do autor é o de “Lusofonia”, a respeito da qual começa Miguel Real por escrever
o seguinte, no item “Lusofonia – história aberta do futuro da língua
portuguesa”: “No século XXI nasceu uma nova teoria da cultura portuguesa
derivada da queda do Império e da proposta do estabelecimento de um possível
vínculo histórico com as ex-colónias, operando uma continuidade cultural sob e
sobre a descontinuidade política. Trata-se da teoria da Lusofonia, cada vez
mais defendida por diversos organizações institucionais da sociedade portuguesa
e já provida de uma longa bibliografia de natureza positiva depois de, nos idos
de 80, ter sido acusada de neo-colonialista” (p. 189). Só este parágrafo dá bem
conta da actualidade do olhar de Miguel Real: muito longe de ser uma
excrescência do passado, como alguns insistem, a Lusofonia é, realmente, a
(maior) palavra-chave do nosso futuro.
2 comentários:
PARA MIM, NADA DISTO É NOVIDADE ACERCA DE MIGUEL REAL. JÁ NA FACULDADE DE LETRAS, ONDE FUI SEU CONDISCÍPULO NO CURSO DE FILOSOFIA, OS TRABALHOS QUE APRESENTAVA NAS DIFERENTES «CADEIRAS» ERAM DE UMA GRANDE INOVAÇÃO, O QUE MOSTRAVA QUE ELE SE DEBRUÇAVA COM SERIEDADE E DEDICAÇÃO, SOBRE OS TEMAS QUE TRATAVA EXAUSTIVAMENTE. JÁ NESSE TEMPO, ANOS 70 DO SÉC. XX, SE ANUNCIAVA O GRANDE PENSADOR QUE É ACTUALMENTE.
JOSÉ LANÇA-COELHO
Concordo com o texto na íntegra. Miguel Real, é sem dúvida UM GRANDE PENSADOR ACTUAL, pelas suas obras e modo de estar na vida, simples e humana. Quem o conhece e convive com Miguel Real, ainda por pouco tempo que seja, é difícil esquecer a transparência de uma alma cheia de riqueza e transbordante de inquietação que deixa nas suas obras atuais, buscando no passado a construção de um novo mundo, confiante que: (citando Renato Epifânio)a LUSOFONIA é, realmente, a (maior) palavra-chave do nosso futuro.
Luisa Timóteo
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