Tal como nós o podemos
apreender, todo o ser é tensão: tensão para o seu sentido. Por isso, já muitos
filósofos afirmaram o que o ser em si mesmo é ilusório, que o ser em si mesmo
nada é.
Todo o ser é, pois, ser-para.
Ele só é, ele só se consuma, nesse seu “para”. Classicamente, esse “para” foi
sendo classificado como a “verdade” – e mesmo no século XX o foi entre nós,
pela mão, por exemplo, de José Marinho.
De forma mais prudente,
preferimos o termo “sentido”. E por isso dizemos: o ser em si mesmo é ilusório,
o ser em si mesmo nada é; ele só é, ele só se consuma, na exacta medida em que
adquire sentido. Esse sentido, por sua vez, absolutamente considerado, pode até
ser ilusório – para o seu ser, porém, ele é toda a verdade, a absoluta, a única
verdade: o que lhe dá real sentido.
Sendo esta, a nosso ver, uma
asserção verdadeira sobre o ser em geral, há que considerar as modalidades bem
diversas através das quais essa asserção se verifica. Olhando para a natureza,
há, desde logo, que reconhecer as diferenças – ora mais subtis, ora mais
abissais – entre os diversos seres.
Começando pelo reino mineral,
poderíamos ser tentados a dizer que, por exemplo, uma pedra é apenas uma pedra.
Mas no reino mineral há processos de transformação análogos ao trânsito entre
ser e sentido, ou entre potência e acto, para usar a célebre categorização de
Aristóteles. Pensemos, apenas para dar um outro exemplo, na forma de
constituição de um diamante. Um diamante será também, num certo sentido, apenas
uma pedra. Mas, apesar de não ter consciência disso, é muito mais do que isso…
Já no reino vegetal, esse
processo é bem mais apreensível. Ainda que das formas mais diversas, há sempre
uma tensão: uma tensão para o crescimento, uma tensão para a multiplicação.
Também aqui, uma árvore será apenas uma árvore. Mas só será árvore na medida em
que cresce e se reproduz. É esse o sentido que, também aqui inconscientemente,
a anima: a seiva da sua seiva. Enquanto vive, todo o ser vegetal é sempre já um
movimento, uma dinâmica.
Esse movimento, essa dinâmica,
é ainda mais evidente se ascendermos agora ao reino animal. Entre uma formiga e
um elefante, as semelhanças são bem maiores do que as diferenças. Obviamente,
há aqui graus diversos de auto-consciência. Prosseguindo no exemplo dado,
apenas um exemplo, um elefante terá um grau de auto-consciência bem maior do
que uma formiga. Em qualquer caso, e este é ponto, a sua diferença em relação
ao ser humano é ainda bem maior, abissalmente maior. Daí o erro, o erro
absoluto, daqueles que, ontem como hoje, ainda que hoje mais do ontem,
enveredam por visões ontologicamente igualitaristas. Os seres naturais já não
são iguais entre si. Em relação a estes, ainda menos o são os seres humanos.
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