Leitor diário do jornal “Público”,
cada vez mais admiro o seu afã europeísta. Não que o partilhe, longe disso. Mas
sempre admirei aqueles que lutam por causas perdidas…
Vem isto a propósito da
cobertura dos Jogos Olímpicos feita pelo “Público”. Começou, logo na primeira
semana, por dar destaque (de primeira página!) a uma vitória inexpressiva (no
cômputo geral) da selecção francesa numa prova de natação em estafetas e,
pasme-se, de um nadador francês (toujours la France…) sobre um nadador
brasileiro, na prova dos 50 m. Mas até aqui compreendo: dado que “a lusofonia
não existe” (cf. Nuno Pacheco, Director-Adjunto, 12.08), é perfeitamente
natural que o “Público” se sinta afectivamente mais próximo da França do que do
Brasil.
O ápice de tão apaixonada
cobertura veio, porém, no fim, em jeito de balanço - na edição de 14 de Agosto,
destacava-se, de novo em primeira página: “Europa foi a maior potência
desportiva dos Jogos Olímpicos: uma selecção da União Europeia teria
conquistado 395 medalhas, contra 104 dos Estados Unidos e 88 da China”. A “notícia”
é tão grosseiramente manipuladora que chega a ser constrangedor desconstrui-la:
desde logo, se a União Europeia tivesse concorrido “como uma nação”, teria, quer
nas provas individuais, que, sobretudo, nas provas colectivas, muito menos
medalhas. Apenas um exemplo, de um desporto que cheguei a praticar: polo
aquático. As três selecções medalhadas foram todas europeias. Se tivesse havido
uma selecção europeia, esta teria ganho apenas uma medalha (e até se correria o
risco dos Estados Unidos e/ou a China ganharem mais uma…).
Reitero: compreendo o afã
europeísta do “Público”, sobretudo nestes tempos em que a União Europeia se
revela cada vez mais uma ilusão, para não dizer uma farsa. Como gosta de
repetir o grande ideólogo do nosso europeísmo caseiro, Mário Soares: “o que faz
falta é um patriotismo europeu”. Sabendo-se que, nestes tempos, o desporto é o
espaço em que, sem pesos na consciência, mais se pode promover o “patriotismo”,
nada melhor do que usar os Jogos Olímpicos para procurar criar esse “patriotismo
europeu”.
Decerto, não valerá a pena
explicar que essa é uma tarefa condenada ao fracasso. O federalismo europeu, de
que agora tanto se fala, numa última “fuga para a frente”, não é de todo possível
(nessa medida, ocioso será discutir se seria desejável ou não). Por mais
manipulações medalhísticas que se façam…
Renato Epifânio
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