A senadora prepara-se assim para propor no Congresso uma lei que autorize o governo brasileiro a sugerir alterações ao Acordo Ortográfico. Estas alterações seriam no sentido de procurar identificar e de corrigir as razoes que fazem com que o Brasil seja ainda hoje o único país a seguir a nova norma, oficialmente e efetivamente, nas novas edições.
No Brasil é conhecida a oposição muito tenaz de largos setores da sociedade lusófona (nomeadamente escritores portugueses) contra o texto de 1990, como reconhece o presidente de honra da Academia Brasileira de Filologia, Leodegário Amarante de Azevedo Filho. Mas o presidente coloca o dedo na ferida ao admitir aquilo que é evidente: somente no decurso da entrada na vida ativa de uma nova geração de alunos é que a grafia do Acordo se irá introduzindo, discreta, mas solidamente nas sociedades lusófonas.
Contudo, mesmo este defensor do Acordo, admite problemas com a redação do texto de 1990 (que usamos para escrever estas linhas), tais como a supressão do trema (no Brasil) ou a supressão de algumas consoantes "mudas", que afinal não o são tanto como pensavam os negociadores de 1990, como aquela que desaparece na palavra "ator". Este último ponto é, aliás, o motivo maior de discórdia em Portugal. Walter Esteves Garcia, da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação brasileira indica também outro factor determinante na origem da resistência portuguesa ao Acordo: a percepção de que o Brasil está a tentar impor a sua grafia ao país matriz da língua, reeditando uma espécie datada de neocolonialismo linguístico. Algo que se resulta do erro crasso (e evitável) cometido em 1990 ao permitir que uma percentagem muito maior de palavras portuguesas fosse alterada contra uma percentagem inferior de palavras brasileiras. Esta desproporção forneceu argumentos aos opositores do Acordo e segue hoje ainda sendo bradada com maior ou menor justiça.
Será assim então o momento de encetar novas negociações? No Brasil começa a ganhar impulso o movimento Acordar Melhor, fundado pelo professor Ernani Pimentel, que tem como objetivo o aperfeiçoamento do Acordo Ortográfico de 1990. O Movimento posiciona-se contra a supressão do trema no Brasil, mas também contra todas as exceções a regras e duplas grafias (lusoafricana e brasileira) atualmente aqui contempladas e a padronização de todos os radicais. O Movimento repete também algumas críticas dos opositores portugueses ao alegar que não existiu aquando do momento da sua redação um debate aberto e democrático. E este movimento Acordar Melhor está a ganhar adeptos entre o Senado brasileiro com apoiantes de peso como o senador Flávio Arns (PSDB-PR) e o senador Cristovam Buarque (PDT-DF).
Se o Movimento lograr obter apoios suficientes no Senado e no Congresso brasileiros o Governo será forçado a avançar no mesmo sentido... Tendo em conta impopularidade do Acordo em Portugal (sobretudo) e no Brasil (menos) a revisão do Acordo será inevitável.
Sempre defendemos o Acordo Ortográfico de 1990. Não exatamente "aquele" Acordo mas O Acordo. O Acordo pode (ainda acreditamos em tal) servir de ferramenta de união dos povos lusófonos, de ponte de culturas, de simplificação de ortografias divergentes e plenas de elementos anacrónicos e de facilitador da aprendizagem do português. Mas este Acordo não foi bem negociado. Dizem que foi o "Acordo Possível", mas desde os primeiros momentos que recolheu críticas de isolacionismo e "academismo exclusivista", de falta de transparência e de cultura democrática por parte dos negociadores. Se o Brasil optar pela revisão do Acordo, haverá condições para aperfeiçoar o Acordo de 1990? Haverá matéria bastante para uma simples revisão, ou as alterações serão tão numerosas que forçarão a um novo e efetivo novo ReAcordo que possa (tarefa hercúlea) sanar todas as críticas que sofreu, de ambos os lados do Oceano, mas especialmente em Portugal?
Vamos ver em que param as águas no que concerne a esta potencial ferramenta de aproximação da Lusofonia antes de aprofundarmos mais a nossa (minha) posição...
Ler notícia: http://www.senado.gov.br/agencia/verNoticia.aspx?codNoticia=97030&codAplicativo=2
4 comentários:
Isso pode ser uma caixa de Pandora. Uma vez aberta... Por isso também, tenho cada vez mais dúvidas de que o Acordo alguma vez vingue, apesar de, no plano teórico, até lhe ser favorável. E sublinhando que, apesar dessa ser também a posição oficial do MIL, o Acordo Ortográfico nunca foi para nós uma questão essencial. A convergência lusófona pode fazer-se sem o Acordo. Até porque o Acordo que mais importa está, obviamente, muito para além do plano ortográfico...
este Acordo nunca foi o "acordo perfeito" que podia ter havido. Foi o possível... Em teoria, concordo, antes um Acordo (mau ou não) do que nenhum, como ferramenta para aproximar os lusófonos.
Um Re-Acordo pode ajudar para a convergência lusófona, já que o de 1990 não deu para tal contributos visíveis. Pelo contrário.
Continuo a defender a necessidade de um Acordo Ortográfico. Este, se não for possível melhorá-lo, ou outro, se tal possível e praticável (o que é discutível).
Friamente eles têm razão. Não sei é da utilidade estratégica...
A uniformização dos radicais para mim é importante.
Eu sofri na pele... Se aqui no Brasil disseres "tem que se ver que isso tem carater excepcional" 99% vão sempre entender, independentemente do contexto "tem que se ver que isso tem carater formidável". Isto acontece pela simples razão de se escrever e pronunciar "exceção" e "excepcional".
A conversa vai longe...
Sem dúvida a convergência lusófona (cultural)está ou vai além do acordo ortográfico,
mas a convergência da língua portuguesa (linguística que é diferente daquela)
prima pelo acordo ortográfico, sobretudo, no que tange à aquisição da escrita no processo de alfabetização de crianças e adultos.
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