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MIL: Movimento Internacional Lusófono | Nova Águia


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"Trata-se, actualmente, de poder começar a fabricar uma comunidade dos países de língua portuguesa"

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Nenhuma direita se salvará se não for de esquerda no social e no económico; o mesmo para a esquerda, se não for de direita no histórico e no metafísico (in Caderno Três, inédito)

A direita me considera como da esquerda; esta como sendo eu inclinado à direita; o centro me tem por inexistente. Devo estar certo (in Cortina 1, inédito)

Agostinho da Silva

domingo, 12 de novembro de 2023

Entre Basílio Teles e José Marinho

 


Como todas as figuras mitológicas, Prometeu é uma figura ambivalente, no sentido em que ambivalentemente pode ser perspectivada. A priori, há pelo menos duas perspectivas possíveis: uma mais positiva, outra mais negativa. Segundo a perspectiva mais positiva, que é, de resto, a mais corrente, a mais comummente divulgada, Prometeu é uma figura heróica que afrontou o divino para ajudar os homens. E que pagou por isso. Tragicamente.
Recordemos a versão do mito mais celebrizada: “Foi por amor aos homens que Prometeu enganou Zeus. Primeiro em Mecone, durante um sacrifício solene, dividiu em duas partes um boi: pôs para um lado a carne e as entranhas do animal, cobrindo-as com a pele; aos ossos, despojados da carne, cobriu-os com gordura, tingindo-os assim de branco. Disse depois a Zeus que escolhesse a sua parte, deixando o resto aos homens. O deus optou pelo esqueleto coberto de banha e, quando descobriu que nesse quinhão só havia ossos, ficou revoltado contra Prometeu e contra os mortais, que a sua astúcia tinha favorecido. Para os punir, decidiu deixar de lhes enviar o fogo.”.
“Então – continuemos a narração do mito –, Prometeu auxiliou-os uma vez mais: roubou algumas sementes de fogo «à roda do sol» e levou-as para a Terra, escondidas num caule de férula. Outra tradição conta que ele tirou o fogo da forja de Hefesto. Zeus puniu os mortais e o seu benfeitor. Aos primeiros, enviou-lhes uma criatura por ele expressamente forjada para o efeito: Pandora. Quanto a Prometeu, prendeu-o com grilhões de aço no cimo do Cáucaso e determinou que uma águia, filha de Equidna e de Tífon, lhe fosse comendo o fígado, que se ia renovando incessantemente.”[1].
A narração do mito prossegue ainda com as peripécias relativas à libertação de Prometeu do seu martírio – “Contudo, Héracles passou pela região do Cáucaso e trespassou com uma flecha a águia de Prometeu, terminando assim o seu cativeiro. Zeus, orgulhoso do feito do filho que ampliaria mais a sua glória, não protestou, mas para que o seu juramento não fosse em vão, obrigou Prometeu a usar um anel feito do aço dos seus grilhões…” –, mas isso, por ora, não nos interessa. Fixemo-nos, pois, no essencial: Prometeu afrontou o divino “por amor aos homens”, sofrendo a dura pena acima descrita. Por isso, tornou-se uma figura amada pelos homens. O que parece lógico: se Prometeu afrontou o divino “por amor aos homens”, parece lógico que os homens o amem por isso.
Será mesmo? Eis a dúvida que queremos aqui suscitar. Para tal, nem sequer iremos argumentar com o facto de, segundo a enunciada narração do mito, tudo ter começado com um primeiro engodo de Prometeu, que originou a ira de Zeus e a sua consequente vingança[2]. A nossa crítica é, procura ser, mais funda. Centra-se na própria lógica de relação entre o humano e o divino que aqui está em causa e que subjaz à enunciada narração do mito: a saber, uma lógica de rivalidade e, por isso, de confronto. Nessa medida, pouco importa saber quem começou esse confronto. Se a lógica da relação é de confronto, isso pouco ou nada importa. Se o humano e o divino se vêem como rivais, o confronto é inevitável. Desde sempre.
Aqui chegados, anteciparão decerto aqueles que nos ouvem que a perspectiva de Basílio Teles sobre Prometeu – por ele exposta no estudo que acompanha a sua tradução do “Prometeu agrilhoado” de Ésquilo[3] – não é aquela em que mais nos revemos, por, precisamente, se fundar numa lógica de relação entre o humano e o divino pautada pela rivalidade e, por isso, pelo confronto. Nada de mais certo, nada de mais errado. Antes, contudo, de dizermos em que medida isso assim é, iremos expor, sucintamente, a perspectiva de Basílio Teles. 
No ensaio filosófico que acompanha a sua tradução do “Prometeu agrilhoado” de Ésquilo, intitulado “A Tragédia”, expõe Basílio Teles a sua perspectiva sobre Prometeu. Justifica, o autor, a acção de Prometeu pela sua “ingénita repulsa por toda a espécie de tirania”[4], que o levou a rebelar-se contra Zeus. Em nome da humanidade, como salienta – e por isso o define como “desinteressado amigo e educador da espécie humana”[5], como “símbolo das forças progressivas que há nela, isto é, das grandes individualidades criadoras que promoveram, e neste momento promovem, essa marcha ascensional para a estabilidade e o embelezamento da existência colectiva, e que pagam com sofrimento, reveses, amarguras, essa iniciativa audaciosa”[6].
Eis, com efeito, na perspectiva de Basílio de Teles, do que se trata: da “afirmação insistente, impetuosa, da liberdade de pensar e de proceder em face da ordem que o advento de Zeus inaugurava, a do medo e do servilismo cobarde dos Olímpicos que lhe aceitaram e defendiam o império”[7]. Nessa medida, plenamente justificada fica, pois, a acção de Prometeu: se Zeus simbolizava o “império”, a “tirania” sobre os homens, havia que lutar contra ele. Na sua revolta contra Zeus, Prometeu simboliza a revolta do humano contra o divino, aqui tido como opressor. Só assim, nessa luta, nessa revolta, poderia a humanidade libertar-se…
Ainda na perspectiva de Basílio Teles, nessa luta se confrontam duas “concepções divergentes”, “que filosoficamente se designam pelas expressões transcendentalismo e imanentismo, vulgarmente pelas de Religião e Ciência”[8]. “A primeira – defende Basílio Teles –, pela contradição irremovível entre deus e o mal (lucidamente reconhecida pela religião dos Medo-Persas), entre deus e a moral por conseguinte, e por ser quase exclusivamente moralista, não comporta uma interpretação unitária e racional do Universo, sem soluções que não sejam sempre dogmáticas: exigindo, pois, a cega submissão do crente a uma Lei indemonstrável e a uma entidade incompreensível.”[9]. Eis, pois, em suma, na perspectiva de Basílio Teles, tudo o que Zeus simboliza: uma ordem transcendente, que exige a plena submissão dos homens pela crença.
A segunda concepção, simbolizada por Prometeu, caracteriza-se antiteticamente àquela – ainda nas palavras de Basílio Teles: “A segunda implica sempre conhecimento e soluções racionais, a conformidade livre e consciente do homem, portanto, com uma Natureza inteligível e com leis verificáveis, por ser criação pura do espírito, em que nenhum mistério, contradição ou incoerência grave se toleram.”[10]. Eis, então, porque Prometeu simboliza, na perspectiva de Basílio Teles, o espírito científico ou imanentista, em antítese ao espírito religioso ou transcendentalista, simbolizado por Zeus. Ele nega a submissão cega, a mera crença, ele exige a plena inteligibilidade do mundo, a plena revelação do ser. Ele nega o lugar do enigma, do próprio mistério, ele exige a inteira luz, o “fogo divino”, símbolo da própria verdade.
Num texto inédito só publicado postumamente, já neste século, escreveu José Marinho as seguintes palavras: “…lendo Basílio Teles, verifico que esse sagaz pensador político, republicano aparentemente paradoxal mas no fundo lúcido e coerente pensador político português, na sua Questão religiosa critica negativamente toda a tendência religiosa e metafísica transcendentalista, semita e judaica pensa ele, e adopta e propaga a tendência imanentista./ Ora se Basílio não fosse demasiado modernista e juvenilista (se o não fosse no seu tempo) teria reparado em que a distinção entre imanência e transcendência não pode pôr-se nos termos em que ele a estava pondo (…). E por isto já Platão no seu Sofista marcara a analogia da situação do filósofo com a da criança. Porque a criança, posta na urgência de escolher entre o bolo e a laranja, estende as mãozitas para ambos. Assim também, explica Platão, entre ser e não-ser, uno e múltiplo, eternidade e tempo, não cabe escolher (…).”[11].
Da mesma forma que, ironicamente, José Marinho acusou algures Sampaio Bruno de o ter pré-plagiado, também nós aqui, com a mesma ironia, acusamos José Marinho de nos ter pré-plagiado relativamente a Basílio Teles. E isto porque, com efeito, o que José Marinho nos diz na passagem citada é exactamente o que pensamos: Basílio Teles vai demasiado longe na sua crítica do divino. Se ela se justifica em relação a Zeus, bem como a qualquer seu sucedâneo Deus-Pai, ela perde validade relativamente a muitas outras figurações do divino, que, ao contrário do que pretende Basílio Teles, não é necessariamente uma instância opressora do humano. Daí também o limite da sua figuração prometeica do humano: ela só é justificável face a um divino opressor. Face a uma figuração não opressora do divino, a figuração prometeica do humano torna-se absurda. Pois que sentido faz lutar contra algo que não só não nos oprime como, na medida em que em nós o assumimos, nos liberta?
Essa é, aliás, a figuração do divino que José Marinho nos propõe – e daí o cabimento da sua crítica a Basílio Teles, bem expressa nestas palavras: “É assim que, para muitos homens, o amor é atributo divino, assim, para muitos, Deus dita normas e julga do bem e do mal. E toda a existência humana perde o sentido se Deus não ama o homem, se não é um Pai para ele, se não é um juiz e um Senhor. Para nós, é justamente o contrário e ousamos dizer que se a maior parte dos homens (dos homens ocidentais: a maioria do euro-americanos) está convencida de que só um Deus criador, um Deus amor, um Deus providência, um Deus pai, um Deus juiz misericordioso, um Deus senhor é o remate compreensível de todo o mal e de todo o possível, de toda a existência terrestre e transcendental do homem – nós, com não menor firmeza, dizemos que Deus não pode ser tal como o nosso coração o deseja, mas como a nossa inteligência o vê. Deus sabe que afirmamos isto para poucos ouvidos e talvez para nenhum. Nem na Idade Média, nem na Época de Cristo assim primitivos estavam os homens, como hoje, tão pouco preparados para admitir uma concepção ética-metafísica de Deus.”.
“E a tal ponto isto é assim – continua Marinho – que quase invariavelmente, quando falamos com um ateu e um agnóstico expondo alguma coisa das nossas ideias neste ponto, eles respondem: «Um Deus como esse não serve para nada. Ou um Deus que intervém na vida e na existência do homem e atende à dor e à desgraça do homem ou nenhum.». Assim falam os homens que dizem amar a liberdade!”[12]. Eis, a nosso ver, a crítica que por inteiro atinge a figuração do divino de Basílio Teles. Com efeito, ao figurá-lo, Basílio Teles desde logo o amaldiçoa por, nas suas palavras, “consentir que as maiores infâmias se pratiquem”, “sendo-lhe por igual indiferente a ira feroz do verdugo e o caloroso gemido da vítima”[13]. Por isso, aliás, o caracterizou Marinho como “o grande irmão-inimigo de Sampaio Bruno”[14] – dado que, partindo ambos da mesma denúncia da “realidade do mal”, chegam a conclusões opostas: enquanto que Bruno procura conciliar essa denúncia com a afirmação da “existência de Deus”[15], já Teles põe em causa não só a “omnipotência de Deus” como, em última instância, a própria “existência divina”[16].
Há, contudo, uma virtualidade nessa crítica do divino de Basílio Teles, mesmo na perspectiva de José Marinho. Se, ainda nas palavras do autor de Verdade, Condição e Destino no pensamento português contemporâneo, “o movimento da filosofia é desabsolutizar o que não é autenticamente absoluto”[17], na “negação de Deus e de todo o divino enquanto é para nós”[18], e assim reconhecer “o autêntico”[19], e assim antecipar “o único verdadeiro”[20], então a crítica de Basílio Teles concorre para este intento. Na sua desconstrução do que perspectivava como o divino, ele, de facto, “desabsolutiza o que não é autenticamente absoluto”. Indo demasiado longe na sua crítica do divino, ele não vai contudo suficientemente longe, pelo menos tão longe quanto Marinho e nós próprios gostaríamos. E por isso não reconhece “o autêntico”, e por isso não antecipa “o único verdadeiro”. Chegou, contudo, a meio do caminho. O que não é pouco. Sem o saber, Basílio Teles cumpriu parte dos próprios “desígnios de Deus” – ainda nas palavras de Marinho: “Tudo se passa como se Deus preferisse ser negado a ser minorado em qualquer forma de antropomorfismo.”; “Deus, desde sempre, não confia na fé e no saber dos homens. Ser negado estava também nos seus desígnios.”[21].
Mas, porque a negação não é nunca o verdadeiro fim último, importa ir mais além… No entanto, dado que, de facto, todo o pensar é situado, não só no espaço como também, senão sobretudo, no tempo, na história, talvez não fosse possível a Basílio Teles ter ido mais além, ao que está para lá da negação. O universo cultural em que viveu era demasiado impositivo relativamente à figuração dita “cristã” do divino. Foi contra essa figuração do divino no seu tempo que Basílio Teles lutou. De forma prometeica, assim pensando libertar os homens. Não foi essa apenas uma luta teológica, ou anti-teológica. Foi também, senão sobretudo, política, sócio-política. Na verdade, Basílio Teles lutou sobretudo contra a Igreja, por ele vista, não sem razão, como o grande sustentáculo da ordem social e política então vigente. O ardor prometeico com que se empenhou nessa luta fê-lo reduzir a figuração cristã do divino ao que era defendido pela Igreja de então, mais ainda, fê-lo reduzir o divino a uma única figuração. Daí o seu ateísmo, ou, como o classificou Pinharanda Gomes, o seu anti-teísmo[22]. Ao contrário do que então não terá parecido possível a Basílio Teles, há, contudo, muito mais vida, muito mais divindade, para além dessa figuração do divino contra a qual ele, não sem razão, lutou. Passados 100 anos sobre o seu falecimento, eis o que mais importa, a nosso ver, afirmar.


[1] Cf. Pierre Grimal, Dicionário da Mitologia Grega e Romana, tradução de Victor Jabouille, Lisboa, Difel, 1992, pp. 396-397.

[2] Recordemos a narração do mito: “Primeiro em Mecone, durante um sacrifício solene, dividiu em duas partes um boi: pôs para um lado a carne e as entranhas do animal, cobrindo-as com a pele; aos ossos, despojados da carne, cobriu-os com gordura, tingindo-os assim de branco. Disse depois a Zeus que escolhesse a sua parte, deixando o resto aos homens. O deus optou pelo esqueleto coberto de banha e, quando descobriu que nesse quinhão só havia ossos, ficou revoltado contra Prometeu e contra os mortais.”.

[3] “A Tragédia”, in Prometheu agrilhoado, Porto, Lello & Irmão, 1914, pp. 97-132 [na edição mais recente (Ensaios Filosóficos, pref. de António Braz Teixeira, Lisboa, IN-CM, 2006), pp. 103-126].

[4] Ibid., p. 102 [p. 108].

[5] Ibid., p. 104 [p. 109].

[6] Ibid., p. 105 [pp. 109-110].

[7] Ibid., p. 107 [p. 111].

[8] Ibid., p. 115 [p. 116].

[9] Ibid., pp. 115-116 [p. 116].

[10] Ibid., pp. 116 [p. 116].

[11] Teixeira de Pascoaes, Poeta das Origens e da Saudade, “Obras de José Marinho”, vol. VI, Lisboa, IN-CM, 2005, p. 463.

[12] Significado e Valor da Metafísica e outros textos, “Obras de José Marinho”, vol. III, Lisboa, IN-CM, 1996, pp. 196-197.

[13] Cf. O Livro de Job – tradução em verso (com um estudo sobre o poema), Porto, Lello & Irmão, 1912, pp. 183-184 [pp. 27-28]. No seguimento desta passagem, diz-nos ainda Basílio Teles que “o Universo não evolve para um destino ético – ao contrário do que pensava o nobre espírito de Antero – para um fim superior de beleza moral, de santidade”.

[14] Cf. Verdade, Condição e Destino no pensamento português contemporâneo, Porto, Lello & Irmão Editores, 1976, p. 195.

[15] Dizendo-nos que “Deus” tolera o “mal” porque, entretanto, deixou de ser “omnipotente” [cf. A Ideia de Deus, prefácio de Pinharanda Gomes, Porto, Lello, 1998 (3ª), p. 243].

[16] Ainda nas palavras de Marinho: “Nos comentários ao Livro de Job considera Basílio o problema do mal, decisivo para ele tanto, ou mais, que para Sampaio Bruno. Mal para ele tão agudo, tão fundo, que constitui fonte de argumentos bastantes não só para negar a providência, como [em] Amorim Viana, ou para negar a omnipotência divina, como [em] Sampaio Bruno, mas para negar o próprio Deus, a transcendência e um fim harmonioso do Universo.” [Verdade…, ed. cit., p. 194]. Cf., igualmente, António Braz Teixeira, Deus, o Mal e a Saudade: estudos sobre o pensamento português e luso-brasileiro contemporâneo, Lisboa, Fund. Lusíada, 1993, pp. 68: “…enquanto Bruno refere dialecticamente o seu pensamento ao de Amorim Viana, Basílio Teles vai formular o seu em oposição a Antero, negando que o universo evolua para um destino ético, para um fim superior de beleza moral e santidade, pois a irrefragável existência do mal na natureza é, para ele, suficiente prova da inexistência de um Absoluto ou de um ser transcendente, superior e exterior ao mundo./ Se, para Amorim Viana, a existência de um Deus, centro de toda a perfeição, toda a luz e todo o bem, era suficiente para postular a inexistência do mal, se, para Bruno, a coexistência de ambos só se explicaria desde que se inserisse o mistério na raiz do próprio filosofar, tornando extensivo o mal a Deus e pondo-o na origem do mundo e do homem, para Basílio Teles é a obsessiva convicção da realidade do mal que o conduz à negação ateia da divindade.”.

[17] Cf. O Pensamento Filosófico de Leonardo Coimbra e outros textos, “Obras de José Marinho”, vol. IV, Lisboa, IN-CM, 2001, p. 334. Cf., igualmente, ibid., p. 436: “Um absoluto é já bastante. Não fazedor de absolutos. Pelo contrário, a metafísica denuncia… Desabsolutização.”.

[18] Assim procurando “purificar a ideia de Deus de todo o vínculo antropolátrico” [cf. ibid., p. 585].

[19] Cf. Significado…, ed. cit., p. 461: “Dissolver os falsos absolutos e reconhecer o autêntico tal é o fim primeiro do pensamento (...).”.

[20] Cf. Aforismos sobre o que mais importa, “Obras de José Marinho”, vol. I, Lisboa, IN-CM, 1994, p. 355: “E assim o que nega [o «ateu iniciático»], nega afinal os passageiros deuses, e antecipa o único verdadeiro.”.

[21] Apêndice documental de A Doutrina do Nada: o pensamento meontológico de José Marinho, Dissertação de Doutoramento em Filosofia de Jorge Croce Rivera, Ponta Delgada, Universidade dos Açores, 1998, vol. III, pp. 177 e 389, respectivamente. Cf., igualmente, ibid., p. 317: “Deus está mais interessado em revelar-se e ser aceite na sua Revelação do que em ser objecto de crença.”.

[22] Mais exactamente, o seu “antiteísmo agonista: o antiteísmo que, sabendo de Deus pela crença, O não justifica por uma adequada teodiceia, porque se apoia no agónico sofrimento do homem no mundo, simbolizado pela mitologia em Prometeu” [cf. Teodiceia Portuguesa Contemporânea, Lisboa, Livraria Sampedro Editora, 1974, p. 32].

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