A posição estética de Raul Leal,
antes de ser uma posição meramente estética, é uma posição ontológica – daí a
designarmos como uma posição estético-ontológica. Tal como Fernando Pessoa – e
talvez até mais do que ele –. Raul Leal procurou, de facto, “sentir tudo de
todas as maneiras,/ Viver tudo de todos os lados,/ Ser a mesma coisa de todos
os modos possíveis ao mesmo tempo,/ Realizar em si toda a humanidade de todos
os momentos/ Num só momento difuso, profuso, completo e longínquo”, como se
pode ler num assaz famoso poema de Álvaro de Campos.
Enquanto em Fernando Pessoa, no
entanto, essa posição parece-nos ser sobretudo – senão exclusivamente – uma
“construção mental”, para Raul Leal ela era, de facto, uma vivência, uma
posição ontológica. Raul Leal procurou, de facto, “sentir tudo de todas as
maneiras,/ Viver tudo de todos os lados,/ Ser a mesma coisa de todos os modos
possíveis ao mesmo tempo,/ Realizar em si toda a humanidade de todos os
momentos/ Num só momento difuso, profuso, completo e longínquo”. Nessa medida,
ele terá sido mais pessoano do que o próprio Fernando Pessoa.
Uma das obras em que essa
afinidade é mais evidente, ainda inédita (mas já em fase de transcrição,
trabalho em que temos estados envolvidos), encontra-se no espólio do Arquitecto
Fernando Távora, na Fundação Instituto Marques da Silva, tutelada pela
Universidade do Porto. Falamos da obra Fernando
Pessoa, precursor do Quinto Império, composta por três capítulos: “Na
Glória de Deus”; “Fernando pessoa, Um dos Oito Maiores de Portugal”; “A dupla
personalidade do Artista-Pensador”. Saliente-se que estes três capítulos
aparecem numerados numa sequência contínua (pp. 1-72), sendo que o primeiro
capítulo é antecedido por um intróito, neste caso ordenado por ordem alfabética
(pp. a-o) – nas duas séries, as folhas têm, na maior parte dos casos, frente e
verso.
Para além disso, nesse espólio
podemos ainda encontrar um “Índice dos capítulos da obra, em preparação, O Quinto Império e a Última Reencarnação de
Henoch” – que, de forma expressa, refere os títulos destes três referidos
capítulos: “Na Glória de Deus”; “Fernando pessoa, Um dos Oito Maiores de
Portugal”; “A dupla personalidade do Artista-Pensador”. Sendo que, nesse mesmo
Índice, os dois últimos capítulos aparecem riscados. Concluímos assim que, num
determinado momento, Raul Leal terá equacionado integrar esses três capítulos
nessa obra maior – mas que manteve a hipótese de coligi-los à parte, sob o
título Fernando Pessoa, precursor do
Quinto Império.
Foi de resto isso que anunciou
nas páginas Revista Presença, onde
publicou um texto (pp. 1-13), com a seguinte indicação: “Publica-se o primeiro
capítulo do livro em preparação Fernando
Pessoa, precursor do Quinto Império”. No referido índice, a respeito do
capítulo “Na Glória de Deus”, pode ler-se igualmente: “diz respeito a Fernando Pessoa, Precursor do Quinto Império”.
Por tudo isso, sentimo-nos pois suficientemente seguros para publicar esta obra
– na premissa de que não estamos a desrespeitar a vontade do autor (o que seria
para nós um óbice intransponível) e de que, claro está, esta é uma obra com
inequívoco interesse – quer, desde logo, por tudo aquilo que Raul Leal nos diz
sobre o pensamento de Fernando Pessoa, quer, não menos importante, por tudo
aquilo que Raul Leal nos diz sobre o seu próprio pensamento. Por muito que,
nalgumas passagens, não seja fácil distinguir um plano do outro.
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