Defendeu
António Quadros que “o pensamento de um filósofo, nascido de uma fusão entre
ele mesmo e o meio circundante, da interpretação das suas faculdades sensitivas
e espirituais e do ambiente humano e mesológico, é eminentemente individual,
local e temporal”. Daí, cumulativamente, a sua expressa defesa de uma
“filosofia portuguesa ou de uma filosofia de língua portuguesa” (ou ainda,
diríamos nós, de uma Filosofia Lusófona) – a qual, sendo expressão da nossa
forma de ser, estar, sentir e pensar o mundo, não poderia jamais constituir-se
como uma forma de enclausuramento,
mas, pelo contrário, de abertura:
“Nunca os teorizadores de uma filosofia portuguesa ou de uma filosofia de
língua portuguesa pretenderam afirmar uma sua existência positiva com
finalidades de enaltecimento nacionalista ou restritivo, e muito menos criar
uma tradição filosófica para satisfação de pruridos autolátricos, castiços ou
aristocráticos.”; “Sejamos solidários com o mundo, mas activamente,
dinamicamente, criadoramente. Esta é a ideia que garante e legitima a
teorização de uma filosofia portuguesa.”.
Na esteira
de António Quadros, equaciona-se pois a nossa “diferença”, a nossa “relativa
verdade”, em última instância, a “relativa verdade” de todas as filosofias. E
isto sem se defender, necessariamente, a relativização da Verdade: “A verdade é
só uma? Talvez. Mas cada homem – e mais largamente cada país, está colocado em
situação diferente em relação à verdade, relação da parte para o todo,
entenda-se. A verdade é só uma, mas desabrocha em infinita variedade e
plasticidade. Reduzir todos os planos da paisagem a uma só, ontem o plano de
Florença ou Roma, hoje o plano de Paris, amanhã o plano de qualquer outra
cultura igualmente totalitária e exigente, é empobrecer as possibilidades de
alargamento de compreensão universal. Pelo contrário, possibilitar o
desenvolvimento de tantas estéticas quantos os países, de tantos prismas de
observação e de conhecimento quantas as resultantes de um determinado
circunstancialismo geográfico, étnico, psicológico, político, social e
filosófico, é aumentar em número proporcional as ‘tomadas de contacto’ com a
verdade.”.
E por isso acompanhamos ainda António Quadros quando este defende
que “ainda bem que os caminhos e os caminhantes são múltiplos e diferentes”. Se
o não fossem, como nos diz ainda, “teríamos todos um único horizonte, um único
modo de ver e de contemplar – marcharíamos todos como carneiros, quem sabe se
para o abismo?”. Ainda nas palavras de António Quadros: “A multiplicação das
culturas, a heterogeneidade dos pensadores, pelo contrário, aumenta
proporcionalmente as tomadas de contacto com o Ser. A existência das filosofias nacionais garante o enriquecimento e a
vivacidade das possibilidades de conhecimento dos humanos.”. Isto, como é
óbvio, na premissa de que cada “filosofia nacional”, de que cada “filosofia
situada”, traz, efectivamente, algo de novo, de único, isto, como é óbvio, na
premissa de que cada cultura, de que cada comunidade, de que cada homem, traz,
de facto, algo de singular. Mas essa é, explicitamente, a premissa de que parte
António Quadros. É, aliás, por isso, precisamente, que, para este pensador, a
própria “identidade portuguesa” está, ainda e sempre, em aberto – à espera que
cada um de nós contribua para o seu “acabamento”.
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