Há um falso consenso em torno
do conceito de Lusofonia. Aparentemente, não há quem seja contra. Na realidade,
porém, se (quase) todos lhe batem palmas e proclamam a sua importância, muito
poucos agem de forma consequente.
Na nossa classe política, por
exemplo, quem já proclamou que “a nossa Pátria é a Língua Portuguesa”? Decerto,
quase todos. Mas quem depois age de forma consequente a uma proclamação dessas?
A nosso ver, (quase) ninguém.
Nesse plano, conseguimos
sentir maior respeito intelectual por alguém que se afirma abertamente contra a
Lusofonia – como, por exemplo, António Pinto Ribeiro (cf. “Para acabar de vez
com a lusofonia”, Jornal PÚBLICO, 02.02.13) –, do que por todos aqueles que têm
em relação à Lusofonia uma posição hipócrita, batendo-lhe palmas apenas para a
fotografia, com reserva mental.
Pela minha experiência nesta
área, sou cada vez mais levado a concluir que a grande linha de fronteira entre
quem é realmente a favor da Lusofonia e quem é contra, de forma aberta ou
dissimulada, passa, no essencial, pela visão que têm sobre a nossa história, em
particular, sobre nossa história de expansão marítima.
Assim, quem sobrevaloriza as
dimensões mais negativas, como a escravatura, tende sempre a ver na Lusofonia,
consciente ou inconscientemente, a mancha de uma espécie de pecado original. Quem,
ao invés, enquadra devidamente essas dimensões mais negativas nos costumes da
época, tende a fazer um balanço geral positivo, em que a Lusofonia é uma
espécie de corolário de toda a nossa história comum, aquilo que, em última
instância, lhe dará, retrospectivamente, um sentido maior.
A questão da escravatura é,
este respeito, particularmente significativa: continua-se ainda hoje, por
ignorância ou má-fé, a absolutizar esta questão quando há muito que se sabe que
a escravatura era, infelizmente, uma prática disseminada na época,
inclusivamente entre os povos africanos. E a quem faz questão de amiúde
recordar a perseguição aos índios na América Latina, pergunto apenas: teria
sido realmente melhor se tivessem sido outros povos europeus a terem lá chegado
primeiro?
É certo que algumas almas
continuam a crer que, se os portugueses nunca tivessem chegado a esse
território que veio depois a ser o Brasil, os índios que lá viviam continuariam
a viver, até hoje, como até então viviam. Mas essa é uma crença que não
resiste, nem por um segundo, a uma visão lúcida da história. Se os portugueses
nunca tivessem chegado a esse território que veio depois a ser o Brasil, o que
se passaria é simples de adivinhar: o Brasil nunca viria a existir; todo esse
território teria soberania espanhola e, olhando para o que se passou ao redor,
seria fragmentado em vários países, todos eles de língua oficial castelhana.
Quanto aos índios: não teriam decerto uma vida melhor. Apenas, falariam
castelhano, em vez de português.
Renato
Epifânio
Presidente
do MIL: Movimento Internacional Lusófono
www.movimentolusofono.org
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