1. Nestas últimas décadas, é
cada vez mais consensual que não temos tido uma visão estratégica nacional. Os
sucessivos Governos têm feito uma mera navegação à vista. Daí a nossa cada vez
menor autonomia. Como não temos tido estratégia, temos sido governados ao sabor
dos ventos. Importa, por isso, definir um novo conceito estratégico nacional, que, não pondo em causa a nossa
integração europeia, aposte mais no Mar, tirando todo o partido da nossa
plataforma continental, que deveremos defender intransigentemente, no âmbito de
um reforço negocial dos nossos interesses estratégicos no seio da União
Europeia, que nos deve levar, no devido tempo, à reconsideração da nossa dívida
externa, no respeito pelos vários acordos internacionais firmados, à escala
europeia e mundial.
De igual modo, deveremos tirar todo o partido da nossa localização
geostratégica. Ao contrário do que tem sido dito nestas últimas décadas,
Portugal não é um país periférico – ou só o é à escala estritamente europeia. A
uma escala global, Portugal pode e deve assumir-se como um elo de ligação
central entre três continentes: Europa, África e América. Daí, igualmente, a
importância do mar e das ligações marítimas, que devem ser devidamente
articuladas com as ligações aéreas (daí a importância estratégica de uma
transportadora aérea que sirva os nossos interesses estratégicos) e terrestres
(defendendo nós uma aposta maior nas ligações ferroviárias, nomeadamente a
criação de um eixo de ligação com a restante Europa).
Paralelamente, devemos apostar muito mais na relação com os restantes
países e regiões do espaço lusófono, porque é essa dimensão que dá a Portugal
uma escala verdadeiramente global, que se estende aos quatro cantos do mundo.
Isso será desde logo importante no plano linguístico e cultural – uma língua
que é falada por cerca de 250 milhões de pessoas é decerto uma língua com o
futuro garantido e base sólida da promoção da nossa cultura a uma escala
mundial –, mas também nos planos económico, pelo potencial de investimento
ainda muito pouco potenciado, e social: com o mercado de trabalho cada vez mais
estrangulado a nível nacional e mesmo europeu, os países lusófonos podem e
devem ser vistos como naturais destinatários de parte da nossa mão-de-obra mais
qualificada, com os quais devem ser estabelecidos protocolos de migração nos
dois sentidos.
Internamente, esta nova visão estratégica nacional deve passar por promover
uma maior coesão territorial e sustentabilidade ambiental: Portugal não pode
continuar a ser um país cada vez mais confinado ao litoral. Isso passa, a nosso
ver, por uma reafirmação do Estado em todo o território – nas suas diversas
facetas, como a segurança –, bem como pela dignificação da Administração
Pública, que tão descredibilizada tem sido nas últimas décadas, não abdicando
nunca das funções soberanas do Estado. Passada a euforia ultra-liberal, mas sem
qualquer nostalgia dos regimes socialistas, é tempo de, sem complexos,
reafirmar a importância de um Estado forte: na sua eficiência e capacidade de
regulação, não no seu peso sobre a sociedade civil. Esta deve ser vista como
parceira e não com suspeição. Quanto mais forte for a nossa sociedade civil,
mais forte será o nosso Estado, mais forte será Portugal.
2. Cada vez mais, toda a gente
diz que o nosso sistema político está esgotado, mas, no século XXI, não há
sistema político realmente alternativo – o regime democrático continua a ser “o
pior, à excepção de todos os outros”. Importa, por isso, regenerá-lo, pelo
aprofundamento da democracia participativa, dando maior peso à participação da
nossa sociedade civil. Nessa medida, a experiência das candidaturas
independentes autárquicas deve ser reforçada e alargada à Assembleia da
República – desde que, obviamente, essas candidaturas tenham uma expressão
minimamente nacional, de modo a evitar situações de caciquismo local.
De igual modo, deveremos
reforçar e alargar o instrumento das consultas populares – a nível local e
nacional. Acreditamos que se a população tivesse disso consultada mais vezes
nestas últimas décadas, não se teriam cometido tantos erros colossais ao nível
da nossa governação. Paralelamente, defendemos a reforma do sistema eleitoral,
visando uma maior proximidade e responsabilização dos eleitores perante os
eleitos. Quando à classe política, e para promover uma maior dignidade da
função, todos os casos de corrupção devem ser exemplarmente punidos e, como
precaução, o regime de incompatibilidades deve ser alargado.
3. O emprego, ou a falta dele, tem sido, cada vez mais, o bloqueio maior da
nossa economia. Devemos, pois, dar-lhe adequada resposta, tendo consciência
que, pelas alterações tecnológicas em curso, a mão-de-obra humana será, em
muitas áreas, como hoje já acontece, cada vez mais dispensável. Devemos, pois,
estar abertos a considerar novos paradigmas de trabalho – tendo como horizonte
não o pleno emprego, cada vez mais utópico, mas a necessidade de providenciar a
todos um sustento mínimo para uma vida digna. Só assim, a nosso ver, se
promoverá a desejável coesão social.
De igual modo, dada essa mudança de paradigma, deveremos reequacionar o
nosso modelo de segurança social. No essencial, propomos que a contribuição das
empresas derive não do número de trabalhadores ao seu serviço mas do volume da
sua facturação – dado que, cada vez mais, as empresas que mais facturam não são
aquelas que têm mais trabalhadores ao seu serviço, pelo crescente recurso às
novas tecnologias. Paralelamente, defendemos uma reforma geral do nosso sistema
fiscal, visando, de forma gradual, o resgate do sobreendividamento das famílias
e das empresas. Finalmente, sem dogmas ideológicos, equacionaremos a melhor
forma de providenciar à população o acesso à Saúde e à Educação – pública ou
privada, o que mais importa é que estas sejam acessíveis e de qualidade.
4. O combate à corrupção deve ser outra das nossas prioridades – não
só pelo dano económico que causa ao país, como, não menos importante, pelo
clima de desconfiança que gera entre os cidadãos. Para tal, impõe-se uma outra
Justiça, que, salvaguardando os direitos fundamentais de todos os cidadãos, não
fique bloqueada com a sobreutilização de expedientes dilatórios, que têm
levado, inclusive, a situações escandalosas de prescrição.
Paralelamente, defendemos uma ampla reforma da Justiça que deve visar os
seguintes valores: proximidade, transparência e confiança. Tudo isto sem
esquecer a questão da morosidade, dos prazos não cumpridos, da burocracia, das
leis menos claras, que permitem múltiplas interpretações, e das custas
judiciais, para que a ninguém fique vedado o acesso a este direito fundamental.
1 comentário:
Concordo inteiramente. Sobretudo que à nossa ligação à Europa não seja subestimada a nossa ligação ao Atlântico, nomeadamente aos países de língua portuguesa. A nossa vocação Atlântica é uma das nossas prioridades fundamentais e daí a necessidade de aproveitar essa «janela de oportunidade», no dizer do Prof. ADRIANO MOREIRA, para que não fiquemos amarrados a apenas uma contiguidade territorial como é a ligação à Europa.
VIRGÍLIO CARVALHO.
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