Temos que reconhecer que é uma
exigência intrínseca do «Espírito Humano» o pensamento de um irrepresentável «Princípio
Absoluto de todas as coisas», ou a tendência para reduzir (melhor: re-ligar)
tudo a um «único princípio»: é uma sua exigência intrínseca de «unidade», na
incomensurável multiplicidade das dimensões que se deparam ao seu conhecimento
e experiência.
Neste contexto, «Deus», como
referência última, que apenas se pode enunciar, pensado como «Alteridade
Absoluta» e fugazmente pressentido como «Infinitos Bondade e Amor», bem poderá
ser talvez a «Resposta» que damos à «Grande Incógnita» que permanece e resiste
lá no fundo de nós e para além de tudo o pouco que sabemos, experienciamos e
explicamos provisoriamente sobre nós próprios, a nossa Existência e o Universo
Englobante … Mesmo porque nos é tão insuportável e difícil permanecermos
expectantes e indecisos face a um tão grande «Ponto de Interrogação»: a
iniludível, incontornável, mas persistente e nunca respondida, pergunta última
sobre a «origem», a «causa primeira» ou a «razão de ser», o «sentido último» e
o «fim» (o além…) de «tudo» o que existe (de todo o Universo, de toda a Vida e
de todo o Ser) e que conhecemos, explicamos e compreendemos provisoriamente e
mais ou menos imperfeitamente, dentro das nossas limitadas possibilidades de
compreensão e de intelecção… Ou a resposta possível para a interrogação
metafísica de que: «Porque há “Ser” em vez de “Nada” ?». Uma pergunta a que,
nem a razão só intelectual, nem a ciência, respondem em definitivo.
Mas, para nós, a Sua plena
inteligibilidade e compreensão não está, em definitivo, ao alcance das nossas
limitadas possibilidades humanas e do equipamento mental com que fomos dotados.
Pois, como o tinha dito já IMMANUEL KANT (Cfr. Crítica da Razão Pura, 1 781-87, 3ª. edição da Fundação Calouste
Gulbenkian, Lisboa, 1 994, pág. 531): «O Ser supremo mantém-se, pois, para o uso
meramente especulativo da razão, como um simples “ideal”, embora “sem defeitos”,
um conceito que remata e coroa todo o conhecimento humano; a realidade
objectiva desse conceito não pode, contudo, ser provada por esse meio, embora
também não possa ser refutada».
Ou seja: a nossa pobre, precária
e indigente condição humana, de «radical desamparo» e de estrutural e finita
imperfeição e «carência ontológica», impele-nos necessariamente para a busca
incessante e constante desse «Absoluto Moral», que só poderá dar-se pelo nome
de «Deus». E isto não pode ser provado, nem refutado, só «racionalmente». É
obra do «Espírito» mais do que da estrita «Razão Pura».
Nem, todavia e por outro lado,
alguma vez pudemos apercebermo-nos de alguma clara e inequívoca «Revelação», ou
sequer supormo-nos dignos de alguma «Graça», especial e pessoalmente
endereçada.
Por isso, Ele permanece,
rigorosamente, um «Mistério», acerca Do Qual nada se pode predicar. Só pode,
portanto, ser assunto de «Fé» (ou de «Esperança»), acerca das quais se deve
antes guardar prudente silêncio.
Também aqui deve imperar sempre o
pensamento da «possibilidade transcendental», i. é, a «possibilidade de
possibilidade», que mantém sempre em aberto a «possibilidade última» (Cfr.
NICOLA ABBAGNANO).
Por outro lado, trata-se,
portanto, aqui, mais de uma «Fé Filosófica», ou «Metafísica», do que pròpriamente
de uma «Fé Teológica» ou «Litúrgica» (Cfr. KARL JASPERS) que, sem obliterar
tudo quanto deve ao Cristianismo, nem pretender contornar («racionalmen- te» ?) o problema da «Transcendência», mas
antes abrir-se a ele, contudo se mantém equidistante e para além de todas as Religiões
e Igrejas estabelecidas.
VIRGÍLIO CARVALHO (Dr.)
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