O próprio acto de procriação fica comprometido e a evolvência da educação duma criança no caso dum casal VIH, sobretudo se esta nasce com problemas, ou até se a mesma nasce sem problemas mas se os pais os mantém. A apreensão com o futuro deixa de ser apenas pela saúde dos pais mas pelo futuro das crianças, consoante os casos, no entanto a longevidade dum seropositivo (a partir do CROI de Fevereiro 2010) foi establecida como sendo igual à dum negativo.
Em tudo isto considere-se que o VIH é hoje nos países desenvolvidos e nos casos onde os ARV's estão razoavelmente disponíveis, um Síndrome Inflamatório Crónico Adquirido e uma doença que predispõe os pacientes para problemas cardiovasculares e para depressões cujo mecanismo ainda não compreendemos completamente.
Se numa fase anterior os ARV's não conseguiam uma protecção eficaz do cérebro, actualmente os existentes são capazes duma penetração elevada que permite combater o VIH e evitar fenomenologias como a demência e a perda das funções cognitivas.
Não obstante o uso de fármacos (e a sua natural e evidente toxicidade necessária para nos manter vivos - ao mesmo tempo que controla o VIH e nos assegura as defesas imunitárias por anos e anos) mantém ainda a evidência dos seus contras: a lipoatrofia e lipodistrofia, por exemplo - estamos, em 2010, a dois anos de descobrir o fármaco que poderá ajudar a diminuir estes efeitos secundários e que são das marcas mais visíveis e temidas. Este é o verdadeiro rosto do estigma para muitos de nós: a verdadeira expressão do uso de anos e anos de antiretrovirais, mas também da nossa sobrevivência.
Muito embora nos últimos anos os médicos tenham vindo a trocar os fámacos mais agressivos neste campo por outros mais recentes. Todavia muitos doentes necessitam deles pelo tipo de resistências ao vírus que mantém, pelo tempo de utilização, ou pela escassez de alternativas terapêuticas no país em causa (por motivos de ordem orçamental). De outra forma ainda são muitos os doentes que continuam a sentir os efeitos deste flagelo de efeitos secundários e em países como Portugal entre muitos outros da CPLP, que não têm apoio do Estado para reparar com o apoio de Cirurgia Plástica, básica na maioria dos casos.
Com estas questões presentes duma forma realista, temos que lembrar as que podemos efectivamente e as que não podemos mudar.
Podemos curamos-nos do VIH? Não, mas podemos ter esperança nisso e no avanço em melhores tratamentos, que aliás estão em fase de desenvolvimento (quase todos os dias saem novidades sobre isso ao contrário de há anos atrás).
Podemos ter uma atitude menos stressante e menos depressiva? Creio que podemos adoptar uma atitude de parar de vez em quando para reflectirmos. Se olharmos para o que se passava há 10 anos atrás e reflectirmos para o que temos, só seremos vítimas se acharmos muito que nos queremos imaginar nesse papel. Razões para isso, a maioria dos que ficou mais recentemente infectado ou está imunologicamente estável...convenhamos: não tem. Os tempos mudaram para melhor...muito melhor.
As depressões são frequentes em muitos seropositivos, mas também tratáveis, com apoio psicológico e psiquiátrico, existindo até psicofármacos mais indicados para os portadores de VIH. Alguns ARV's induzem mesmo alterações de ordem psiquiátrica como efeito secundário.
Mas nem todos o fazem, nem toda a gente reage assim. A mesma coisa com a diarreias e disturbios digestivos. Há pessoas que têm genes óptimos, sorte, enzimas...Graça Divina. O que quer que seja funciona...
Mas há pessoas que custam mais a estabilizar do ponto de vista da sua qualidade de vida. Os co-infectados e são uma grande percentagem entre nós, que têm entre si os portadores/as de hepatites (mais comuns) e que trazem sempre mais complicações ao paciente. Ou as tuberculoses...tão perigosas que se diz que um dia num futuro não longínquo, suplantarão o risco de epidemia do VIH/Sida!
Há o stress necessário e aquele que nós importamos de coisas descessárias, que se pensássemos melhor nem nos metíamos nelas. O stress, ao produzir o aumento duma hormona como o "cortisol", produz alterações agressivas em todos nós. Lembrarmos os ratinhos de laboratório que expostos a stress em demasia perdem o pelo, a imunidade e que desenvolvem cancro é talvez uma alegoria, mas mostra que até em mamíferos inferiores faz mal.
Podemos ter o direito a sentirmo-nos socialmente integrados? Não apenas o direito como o dever. O estigma e o preconceito existem e seria um erro crasso negá-lo.
Numa comunidade de seropositivos, qualquer pessoa com VIH/Sida se sente segura e na sociedade em geral juridicamente todos temos o direito à não discriminação que lhe é constitucionalmente garantida (embora ao nível do Direito Internacional, umas dezenas de países ainda proíbam a entrada a seropositivos).
A atitude de revelar a sua condição de saúde é por isso algo de muito íntimo e não deve ser tomado de ânimo leve, apesar do que atrás se disse (tal como a opção sexual). Temos por isso a obrigação connosco próprios de procurar formas de sociabilizar abertamente e sempre que possível, para que nos possamos sentir mais iguais, mais libertos e menos sós.
Qualquer que seja a situação, a verdade é que passa por estarmos vivos e fazer parte dessa realidade da melhor forma possível é a nossa missão, já que não somos em nada diferentes do restos das outras pessoas no direito a sermos felizes.
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