No curto espaço de uma década, Portugal e Angola protagonizaram uma reviravolta assinalável. Ao recuperarem e revitalizarem os laços outrora considerados irremediavelmente danificados – devido a um processo conturbado de (des)colonização, por um lado e aos efeitos da guerra civil angolana na classe política portuguesa, por outro – ambos os países encontram-se agora perante a oportunidade de definir a curto e médio prazo o grau de parceria que desejam estabelecer para os próximos anos.
Face às necessidades imediatas de reconstrução em Angola, as autoridades portuguesas cedo compreenderam o importante papel que poderiam desempenhar, através de apoio e assistência – €200 milhões nos últimos dez anos, em Programas Indicativos de Cooperação – a uma nação ainda a recuperar das feridas da guerra civil. Ao mesmo tempo, era perceptível o importante contributo que Angola poderia desempenhar no próprio posicionamento internacional de Portugal.
De facto, tem sido no plano externo, com destaque para a cooperação a nível das instituições multilaterais, que esse contributo mais se tem feito sentir. No âmbito da CPLP, os dois países detêm actualmente – em conjunto com o Brasil – o estatuto não-oficial de motor da construção da comunidade lusófona e um consenso entre estes actores revela-se por isso, frequentemente necessário. De igual modo, nas Nações Unidas, tanto Portugal como Angola têm repetidamente apoiado as respectivas ambições a lugares de destaque, incluindo a presente candidatura portuguesa a membro não-permanente do Conselho de Segurança, para 2011-2012.
É, no entanto, no contexto da União Europeia, que ambos os países têm sabido aproveitar melhor o seu passado e afinidades. Por um lado, Portugal nunca se coibiu de utilizar as suas credenciais políticas no continente africano – como aquando da realização de ambas as Cimeiras UE-África, sob a Presidência portuguesa da UE –, muito menos quando se trata de aprofundar as relações entre a Europa e as suas ex-colónias. Por outro, Angola cedo compreendeu o potencial inexplorado de um parceiro preferencial dentro da UE, que promovesse pontes entre os dois continentes.
É assim neste contexto que se compreende o trabalho de bastidores da diplomacia portuguesa na concretização de uma nova parceria estratégica entre Angola e a UE, de momento, em fase avançada de negociações. Inversamente, este raciocínio de apoio mútuo é igualmente aplicado no desejado apoio angolano a uma auto-declarada pretensão portuguesa de maior inserção diplomática no espaço da promissora Comunidade para o Desenvolvimento da África Austral (SADC).
Os obstáculos não são, por sua vez, inexistentes – desde a recorrência à retórica colonialista até ao fraco respeito pelos direitos humanos em Angola – mas as duas partes têm sabido contorná-los de forma discreta e constante, em nome do reforço das relações bilaterais.
No fundo, tanto Portugal como Angola facilmente reconhecem as vantagens mútuas que é possível obter a nível da cooperação política e diplomática. Embora longe de consistir o instrumento definitivo para a resolução dos problemas e/ou prossecução das agendas externa respectivas, muito pode ainda ser alcançado no contexto bilateral, através de uma parceria estratégica, equilibrada e duradoura.
Pedro Seabra
Instituto Português de Relações Internacionais e Segurança (IPRIS)
Fonte: Sapo Notícias
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