Havendo já vários estudos, está ainda por fazer um
balanço exaustivo sobre o contributo dos intelectuais portugueses que no
Brasil, por razões várias, década após década, se fixaram ao logo do século XX
– contributo não apenas para a cultura brasileira, mas para a nossa comum
cultura lusófona.
O primeiro dos mais proeminentes a deixar uma marca
indelével no Brasil terá sido Fidelino de Figueiredo. Tendo saído de Portugal
ainda na década de 20, fixou-se Brasil entre 1938 e 1951 e, sobretudo na
Universidade de São Paulo, deixou uma plêiade de discípulos que, ainda hoje,
promovem essa ponte cultural entre o Brasil e Portugal.
Nas décadas seguintes, já no período do Estado Novo, vários
intelectuais fixaram-se também, em diferentes épocas, no Brasil – nomeadamente,
Jaime Cortesão, Adolfo Casais Monteiro, Jorge de Sena e Eduardo Lourenço. Sendo
que aqueles que mais estiveram no Brasil não apenas enquanto exilados – mas
como plenos cidadãos luso-brasileiros – terão sido Eudoro de Sousa e,
sobretudo, Agostinho da Silva, que, a partir do Brasil, nos legou um horizonte
de verdadeira fraternidade, não apenas cultural mas também política, entre o
Brasil e Portugal.
Já após a Revolução de 1974, houve uma nova leva de
ilustres exilados – nomeadamente, de professores saneados de Universidades
Portuguesas, facto que em Portugal, ainda hoje, só vai sendo reconhecido com
alguma, quando não bastante, relutância. Uma vez mais, porém, azar de Portugal,
sorte do Brasil, que recebeu, na década de setenta, mais alguns intelectuais
portugueses.
Falamos aqui, em particular, de Francisco da Gama
Caeiro e de Eduardo Abranches de Soveral, das Universidades de Lisboa e do
Porto, respectivamente. Em particular no Rio de Janeiro, na Universidade Gama
Filho, em parceria com alguns ilustres professores brasileiros – como António
Paim –, também eles deixaram – tal como Fidelino de Figueiredo, meio século
antes – uma plêiade de discípulos que, ainda hoje, promovem essa ponte
cultural entre o Brasil e Portugal. Neste caso, uma ponte particularmente sólida, dado que
filosoficamente fundamentada.
Anna Maria Moog Rodrigues é um
dos melhores exemplos dessa plêiade. Com um percurso tão sinuoso quanto rico –
graduada em Filosofia pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (1957) e com um Mestrado
em Filosofia pela Universidade do Kansas, nos Estados Unidos da América (1961),
doutorou-se depois em Filosofia pela Universidade Gama Filho (1982) e, já nos
anos noventa, beneficiou de um bolsa de estudos do Instituto Camões para
aprofundar in loco
as suas incursões pelo pensamento português. Este livro, Abordagens no pensamento português, reflecte todo esse
aprofundamento.
Detendo-se em figuras maiores do pensamento português contemporâneo – de, entre outros, Antero de Quental, Cunha Seixas, Amorim Viana, Sampaio Bruno e Leonardo Coimbra, até Delfim Santos, Afonso Botelho, António Quadros, Pinharanda Gomes e António Braz Teixeira –, Anna Maria Moog Rodrigues prova uma vez mais ser uma das pensadoras brasileiras que melhor sabe cruzar essa ponte filosófica-cultural entre o Brasil e Portugal. Nos 200 anos da independência do Brasil, eis uma bela forma de celebrar o que mais no une: não já uma filosofia apenas luso-brasileira mas, mais extensivamente, uma filosofia lusófona, extensiva a todos os falantes da nossa língua comum. Gratos, Anna Maria, por esta valiosíssima dádiva à nossa causa da Lusofonia.
1 comentário:
Caro
Renato Epifânio
Mais uma vez o felicito pelo oportuno artigo, que, a propósito do livro da Amiga Ana Maria Moog, lembra os muitos e valiosos contributos resultantes de exílios, que afinal o não foram de todo, de portugueses no Brasil. Lembro, por exemplo, os de Lúcio Pinheiro dos Santos, de Cândido da Costa Pinto e sobretudo o de Afonso Botelho. Aliás, para alguns, pelo menos, foi a partir do Brasil que melhor passaram a compreender Portugal.
Com o abraço de sempre,
Joaquim Domingues.
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