03 Dezembro 2009 - 00h30
Defesa: Chefe de Estado-maior do exército pede clarificação legal
Exército na rua ao lado da polícia
O Chefe de Estado-Maior do Exército quer ver os militares nas ruas a cooperar com as forças de segurança interna, mesmo que para o efeito seja necessário proceder a alterações na lei.
'Os meios policiais são insuficientes para dar resposta às novas formas de conflitualidade, e o Exército tem de cooperar', disse ontem o general Pinto Ramalho num discurso durante o almoço de comemoração dos três anos da revista ‘Segurança e Defesa’, perante o olhar atento do director nacional da PSP, Oliveira Pereira.
'Actualmente há uma fronteira difusa entre a segurança interna e externa. E há capacidades instaladas no Exército para responder a um determinado nível ou grau de ameaça. A primeira linha de resposta deve estar na PSP e na GNR, mas poderemos estar numa circunstância em que isso não chegue e então, naturalmente, o Exército poderá dar resposta, segundo o enquadramento constitucional', afirmou Pinto Ramalho.
O problema está na Lei de Defesa Nacional, que só autoriza a intervenção a título excepcional das Forças Armadas perante ameaças estrangeiras, à excepção de missões de socorro provocadas, por exemplo, por catástrofes naturais. O general defendeu que deve existir uma 'visão pragmática' da questão, que só poderá ser posta em prática com 'uma forma legislativa perfeitamente clarificada'.
O Chefe de Estado-Maior do Exército foi na altura interpelado pelo general Loureiro dos Santos, que defendeu a opinião de Pinto Ramalho. 'Em caso de ameaças transnacionais podem surgir situações de indefinição quanto ao emprego de meios militares, pelo que é necessária uma revisão da Constituição', disse o ex-CEME.
No mesmo discurso, Pinto Ramalho defendeu que os cidadãos com serviço militar cumprido deveriam ter prioridade no recrutamento para as forças de segurança, tal, o que seria 'um incentivo à prestação do serviço militar'.
João C. Rodrigues Fonte: Correio da Manhã (o diário populista dos «recados»).Comentário
De há algum tempo a esta parte, a aposta na terceiro mundialização de Portugal parece ser a grande resposta à incapacidade política de solucionar os problemas do País. Forças armadas e forças policiais parecem querer seguir essa tendência de substituir a inteligência pela brutalidade da força.
Num País em que os fluxos migratórios têm sido mal equacionados, ou apenas contextualizados em constructos legais ideológicos, e nunca entendidos em termos pragmáticos, económicos e sociais; em que a Educação está ao abandono, sem nunca se ter elaborado uma política educativa que equacionasse a questão migrante, proporcionando às minorias étnicas um currículo de disciplinas opcionais, que fornecessem conhecimentos da história e cultura dos grupos nacionais de que sejam provenientes, construindo desse modo nesses jovens o orgulho saudável de pertencerem a grupos étnicos distintos, em vez de os deixar entregues ao MTV, aos telemóveis, ao hi5 e ao MSN; em que nunca houve um plano sensato de aculturação das minorias étnicas (sim, escrevi aculturação, é que eu sou pragmático, e nesta questão borrifo nos «paraísos lusos» direitistas e esquerdistas), que lhes permitisse enquadrar-se como Portugueses; em que se está a esquecer a aplicação do juris solis, em que a toda a criança nascida em território português lhe deveria ser concedida, de imediato, a Nacionalidade Portuguesa (e não me venham com desculpas burocráticas!, se não houver «papelada» da parte dos pais, dois Portugueses como testemunhas bastam!); etc, etc – vem agora o senhor Chefe de Estado-Maior do Exército largar uma bacorada destas para a comunicação social!
Pois bem, no dia em que eu vir o Exército Português nas ruas a «combater o crime», juntar-me-ei aos marginais. Nesse dia a questão passará por mim a ser entendida como política, e terei toda a justificação para disparar contra quem me oprime.
K. N.
Já agora mais uma Nota:
Qualquer resposta ao actual regime, que seja o reeditar de ideologias e «soluções» a que a História já fez o funeral, seria a vergonha da Nação, perante os nossos pares europeus e o mundo: «os medíocres dos Portugueses que não sabem viver em democracia»!
O lugar das Forças Armadas Portuguesas é nos quartéis e não a entupir a via pública: corredores da civilidade e da cidadania.
Toda a mudança de regime só deve acontecer, depois de se ter algo para onde mudar. E este deve ser o trabalho do patriotismo: encontrar essa via, e que ela ainda seja democrática.
19 comentários:
... acredito que, enquanto movimento cívico, que luta por uma civilização lusófona, esse é também o papel do MIL.
Espero que a presença do Professor Adriano Moreira neste almoço possa ter contribuido para o esclarecimento de qual o papel das Forças Armadas num regime democrático em que o poder é civil...
Nâo vejo as coisas com essa simplicidade. Tudo tem a ver com a gestão de picos.
A polícia e o exército não são propriamente empresas que no caso de excesso despedem e no caso de necessidade contratam...
Sendo Angola território português na altura, porque ia o exército combater os terroristas?
Em toda a guerra colonial morreram 8000 soldados.
No Brasil morrem todos os anos 50000 pessoas vítimas de violencia organizada. Sim já fiz as contas de per capita e por tempo, dando todas as margens para tudo. Continua muito maior... Ou seja vive-se em guerra no Brasil, ou a guerra colonial não era guerra.
Vejo em ti uma certa contradição. Te dizes pragmático, mas se vê mais um fundamentalismo teórico que se calhar não se coaduna aos dias de hoje. Por outro lado, exército não significa mis brutalidade, isso é um preconceito gratuito.
Não quero dizer que concorde com isso. Penso é que possa ser algo equacionável e que não cabe esse escandalo. Perante novas realidades, novas discussões.
Este é o texto mais importante até agora publicado aqui.
Ressalvo, só, a possibilidade de o senhor general se estar a referir só ao 'terrorismo', que não sei se cabe no conceito de 'ameaça estrangeira' que define o papel das Forças Armadas. Mas também ressalvo que o 'anti-terrorismo' faz de há décadas para cá parte crucial da política menos clara dos poderes 'ocidentais' (não dos portugueses, que felizmente não somos 'potência')
Tirando isso, é isso.
Caro Paulo Pereira, com a maior honestidade lhe digo que, de todo, não percebi o seu comentário.
Achas? Foi «recado» ao director da PSP e ao Governo.
P. S. Aliás, durante o anterior governo (deste Governo) as Forças Armadas deram muitos «recados», mas depois ficaram mais «calmas», quando as medidas governamentais que lhes iam diminuir privilégios e vencimentos ficaram pela metade...
Tudo está decadente neste País, a começar pelas Forças Armadas, e pela «brigada do reumático» que as dirige...
Paulo, não li o seu comentário antes de redigir o meu. Para além do valor simbólico da presença de forças armadas na rua - sobre a situação no Brasil não me vou pronunciar - a primeira questão é a de saber se posso fazer valer os meus direitos diante de um soldado de arma automática em punho tão facilmente (!) como diante de um polícia de giro.
Mas noto que o general falou, aparentemente, de 'fronteira difusa entre segurança interna e externa', e isso não é o caso, claramente, da ameaça gerada por 'marginais de bairro', traficantes locais, etc.
E digo isto porque Portugal não está em "guerra" nem no sentido em que Angola o esteve em 1961 nem no sentido em que o Brasil (as cidades?) estará eventualmente hoje.
Clarificando ainda mais: se o general está a dizer que a Europa pode entrar em colapso e que nessa altura o exército deve intervir - isso mesmo, meio em tom de brincadeira, me disse o Klatuu num comentário aqui há uns dias (por causa do Dubai e da crise financeira). Isso acho que é indiscutível, e mais, não vejo que 'limitações constitucionais' se oponham a isso.
É obviamente uma leitura possivel, Klatuu. Mas neste tipo de problemas ('polémicas' como dizem os neo-néscios) convém começar por traçar uma linha que é o limite do aceitável. Sem prejuízo de, depois, avançar.
P. P. S. Baixas na Guerra Colonial...
A presença dos militares e para-militares nas ruas do Brasil têm dado o que sabemos: algo próximo do genocídio! Como todos, eugénico, no caso, socialmente eugénico...
Os Exércitos, todos, são uma racionalização da brutalidade, essa racionalização - e racionalidade - cessam assim que deixam de ser governados pelo poder civil.
Às polícias devem ser fornecidos todos os meios para combater a criminalidade, garantir a ordem pública, a defesa do cidadão e da propriedade pública e privada, como também a própria vida dos polícias - mas também a dos criminosos. Neste País não há pena de morte, e as penas são atributo dos Tribunais.
O combate ao crime não é uma guerra em que polícias andam a abater marginais nas ruas. E o papel das Forças Armadas não é esse - esse seria um papel desonroso para qualquer militar!!
Mas o grande, e o único eficaz, combate à criminalidade é a resolução dos problemas sociais e das injustiças que conduzem tantos, e cada vez mais, à marginalidade. E o maior deles neste País tem sido a estigmatização, e abandono, das minorias étnicas!
O «Portugal da multirracialidade e da miscigenação, com um talento único para o diálogo multicultural»... Ora! não me lixem! (com F!).
Reli agora, e ainda bem.
A referência a "ameaças transnacionais" não é do actual CEME, mas de Loureiro dos Santos.
Curioso.
Ora este post faz-me lembrar um tema para o meu primeiro post neste blog... Segue-se uma Citação Noctivaga Excepcional...
Abraço
Independentemente de tudo, tenho medo que esse general saiba algo mais do que nós...
Estive na Marinha dois anos e tenho bem ciente do que pelo menos eram as forças armadas... Para se chegar a General é preciso geralmente muitas qualidades, por mais lobbies que se tenha. Por outro lado, eles são conhecedores exaustivos de toda a teoria de defesa interna e externa desde o império romano cujos conceitos gerais se mantém firmes até hoje. Por isso respeito a opinião dele, embora não me incline a ela.
Paulo, são dois generais os referidos, ainda que o discurso tenha sido do CEME. O general Loureiro dos Santos é talvez o homem que mais sabe de estratégia e geopolítica em Portugal. Usualmente publica crónicas na imprensa que estão reunidas em livros também, muuito boas por exemplo no acompanhamento da guerra do Iraque.
Espero que saibam ambos mais do que nós. Mas isso aplicar-se-ia a todos os famosos generais sul-americanos dos anos 60 e 70: ou seja, o que importa e o que fazem eles com esse conhecimento.
Quando a 'crise' económica alastrar, o sistema fabricará a necessidade de policiamento reforçado. Sempre foi assim.
No entanto, a notícia do Correio da Manhã não é clara: os dois generais estão a falar da mesma coisa, ou não? O LS fala de 'transnacional' (obviamente, terrorismo, pois as outras estão enquadradas na NATO). O gen. Ramalho parece estar a falar de assuntos internos. Aliás, um fala de alterar a Lei de Defesa e o outro de alterar a Constituição.
Infelizmente nao encontro mais referências na imprensa a este discurso.
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