Iniciou-se no último dia de
Janeiro, coordenado pelo MIL-Norte, um Ciclo evocativo de Sampaio Bruno por
ocasião dos 100 anos do seu falecimento, no Ateneu Comercial do Porto, que se
prolongará até ao final do ano. O ponto alto deste ano brunino será um
Congresso, a decorrer igualmente no Porto, entre os dias 5 e 7 de Novembro.
No entender de José Marinho, um
dos seus mais insignes hermeneutas, o que essencialmente caracteriza o
pensamento de Sampaio Bruno é a sua heterodoxia. Marinho chegou, aliás, a
qualificar a concepção brunina como a “concepção mais heterodoxa da filosofia
portuguesa”.
Ainda segundo Marinho,
consubstancia-se essa heterodoxia num duplo sentido: “O pensamento de Sampaio
Bruno é, como se sabe, essencialmente heterodoxo. Tal deve entender-se em dois
sentidos. Heterodoxo é o pensamento de Bruno em relação à ortodoxia católica.
Heterodoxa é também a sua teurgia
profética em relação à ortodoxia humanista, ou humanitária, que se formou,
como irmã inimiga, na sequela da primeira.”.
Não se consubstanciou, porém,
essa dupla heterodoxia numa mera “carnificina de sistemas”, para retomarmos a
já consagrada expressão de Eduardo Lourenço. Segundo o próprio José Marinho,
“na sua oposição ao moderno evolucionismo progressista e ao humanismo
satisfeito, ele [Bruno] descerrou o segredo profundo daquilo mesmo a que teve
de opor-se”, da mesma forma que, na sua oposição à ortodoxia católica,
“assegurou melhor o caminho do autêntico, profundo e velado cristianismo do que
muitos cristãos de satisfeito saber e formal observância”.
Daí, em suma, para José Marinho e para muitos outros estudiosos da
nossa tradição filosófica, toda a importância de Sampaio Bruno para o
pensamento português contemporâneo – fazendo jus ao seu apelido, que
José Pereira de Sampaio adoptou em homenagem a “um dos filósofos mais
revolucionários do Ocidente”, Bruno
“antecipa com seu pensar ao mesmo tempo difuso e concentrado algumas das formas
mais autênticas da filosofia e dos caminhos da nossa época”.
E por isso o considerou como “o mais profundo dos nossos filósofos
críticos e o mais excessivo”, sendo “difícil será encontrar em qualquer parte
pensamento mais audacioso e mais original do que o deste homem tímido e
embaraçado”, e por isso nos disse ainda, a respeito da sua obra, que ela se
constitui como “a mais significativa expressão do drama espiritual do homem
moderno no trânsito do século XIX para o presente”, tendo inclusivamente
afirmado que “a sua obra só por si vale todo o século XIX, perante ela
empalidece tudo quanto a grande geração de Antero ou Oliveira Martins fez”,
assumindo-se, nessa medida, como “o ‘juízo final’ do nosso século XIX” e, nessa
medida ainda, como uma das pontes para o nosso futuro.
Post Scriptum: IV Ciclo de Conferências do Colóquio Nacional sobre
Raul Lino em Sintra, a decorrer a 4 e 5 de Fevereiro no Palácio de Seteais e no
Centro Cultural Olga Cadaval.
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