11 propostas mínimas
Fernando Santos Neves
Na linha da minha Carta Aberta ao secretário-executivo da CPLP, a propósito da Cimeira de Luanda de 23 de julho de 2010 (publicada no jornal Grande Porto de 30 de julho e 27 de agosto de 2010) e remetendo nomeadamente para o opúsculo Para Uma Crítica da Razão Lusófona: 11 Teses sobre a CPLP e a Lusofonia (Edições Universitárias Lusófonas, 2000), para a comunicação de abertura do I Congresso Internacional da Lusofonia (Lisboa, 2003) e para a Tese sobre a Lusofonia publicada no jornal i de 25 de outubro de 2010, por ocasião do Encontro Internacional sobre a Língua Portuguesa e Culturas Lusófonas num Universo Globalizado (25/26 outubro 2010, em Lisboa, na Fundação Gulbenkian e onde os organizadores conseguiram realizar o milagre de falar da “Lusofonia” sem que os responsáveis até pela existência de tal vocábulo tenham sido ouvidos ou achados), permito-me, da maneira mais pragmática, apresentar as seguintes “11 Propostas Mínimas”, para que a CPLP valha minimamente a pena e mostre, parafraseando o célebre verso, que «a sua alma não é pequena».
Não sem antes insistir na ideia de que a CPLP/Comunidade Lusófona não deve impedir ou prejudicar a inserção dos seus países e povos nos respectivos espaços geofísicos e geopolíticos locais ou globais. E no caso de Portugal e contra o que então designei de «doença infantil do luso-europeísmo» (que, é verdade, paradoxalmente evoluiria, muitas vezes com os mesmos sujeitos, para o que também designei de «doença senil do antieuropeísmo patrioteiro»), não me tenho cansado de repetir que Portugal só poderá ser interessantemente lusófono na medida em que for plenamente europeu como, aliás, só poderá ser interessantemente europeu na medida em que for plenamente lusófono…
1. Mudar imediatamente a velha denominação CPLP — Comunidade dos Países de Língua Portuguesa para a denominação mais “cairológica” de Comunidade Lusófona, que, obviamente, remete para mas vai além da questão da Língua Portuguesa (para já não falar da absurda fórmula, que por vezes ainda se ouve mas espero que já só por inércia, de “Expressão Portuguesa”) como também obviamente remete para mas pode e deve ir além dos países-Estados independentes e estar aberta a povos e diásporas como a Galiza e Goa e Macau e Sacramento e comunidades emigrantes e etc. (mesmo se com estatutos diferenciados, o que não significa necessariamente menores…). Simbólica e sintomática foi, por exemplo, toda a polémica relativa à bondade ou à maldade, à virtude ou ao pecado da admissão da Guiné Equatorial no seio da CPLP. Como então escrevi, oxalá viessem, e rapidamente, muitos mais países e povos e fizessem da CPLP uma organização de influência decisiva no desenvolvimento sustentado e no respeito de todos os direitos humanos (a começar por tantos e tantos membros da ONU e, eventualmente, por alguns dos membros da atual CPLP, sem excluir Portugal, pela maneira nem sempre muito digna como trata os seus imigrantes, lusófonos e não lusófonos).
É perfeitamente compreensível, aliás, que a CPLP não tivesse ainda no seu nome a designação de «lusófona», já que o próprio termo «lusofonia» só chegaria mais tarde (mas a boas horas e por minha máxima e feliz culpa) aos dicionários da Língua Portuguesa.
2. Acabar imediatamente com a inclusão dos «negócios ou relações lusófonas» no âmbito dos Ministérios dos Negócios Estrangeiros ou das Relações Exteriores.
Ou será que os «lusófonos» continuam, de fato, a não passar de simples «estrangeiros» ou de simples «Exteriores»?
E que se espera para criar um autónomo e visivelmente poderoso Ministério da Cooperação Interlusófona?
3. Avançar imediatamente para a criação de um Parlamento Lusófono, símbolo maior das democracias modernas, cujo primeiro presidente pelo menos honoris causa bem merecia ser essa grande personalidade lusófona que dá pelo nome de António de Almeida Santos e bem assim para a criação de um Banco Lusófono, num tempo em que a economia política (que não necessariamente essas «economias de casino e de merceeiro» de tantos dos nossos “contabilistas” de serviço) é muito justamente reconhecida como a base real das sociedades e a rainha das ciências sociais e humanas.
4. Declarar inaceitável a ainda não existência de um comum “Passaporte Lusófono” e de uma comum “Cidadania Lusófona”, sem os quais não pode haver CPLP ou Comunidade Lusófona ou Lusofonia dignas desses nomes. Quando é que os cidadãos dos países lusófonos tornarão suas as palavras de Cícero contra Catilina e dirão: Quousque tandem… Até quando continuarão todos esses Estados e Governos e suas incompetentes burocracias a abusar da nossa paciência lusófona?
5. Tomar a designação do Brasil para membro permanente do Conselho de Segurança da ONU como objetivo prioritário, o que, além de digno e justo no âmbito da reconfiguração da Nova Ordem Internacional, seria também mais que racional e salutar do ponto de vista de afirmação da Lusofonia e da Comunidade Lusófona. A criação de uma Força de Segurança Lusófona Comum seria também extremamente desejável e urgente.
6. Tomar definitivamente a sério a questão da Língua Portuguesa e não permitir, sob nenhum pretexto, que uma das pouquíssimas línguas potencialmente universais do século XXI seja tantas vezes reduzida ao lugar e papel de uma língua quase insignificante (na ONU e respectivas organizações associadas, no Vaticano, nos congressos internacionais, nos Prémios Nobel da Literatura, etc.). Quando é que os países e povos lusófonos darão o verdadeiro sentido às palavras de Fernando Pessoa: «Minha Pátria é a Língua Portuguesa»? E, também, utilizando as palavras de Manuel Maria Carrilho, quando descobriremos que «o respeito pela Língua Portuguesa não é compatível com o uso do "portunhol", do "franciú" ou do "bad english"» (Diário de Notícias, 28 de outubro de 2010)? E quando é que a conclusão-voto da XIV Semana Sociológica, organizada na Universidade Lusófona do Porto, em abril 2009 e que preconizou «a criação naquela cidade, de uma Academia Lusófona da Língua Portuguesa, principia a ser efectivamente realizada? E neste campo nunca será assaz louvado o papel do Jornal de Letras... e respetivo fundador-diretor, José Carlos Vasconcelos.
7. Acabar, também definitivamente, com essa tragicomédia (representada, sobretudo, por Portugal e seus últimos abencerragens de mentalidades colonialistas e de causas perdidas) da falta de cumprimento do novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa, que não será, como de facto não é, tecnicamente perfeitíssimo, mas é uma exigência geopolítica do novo século em que o Brasil surge como uma das grandes potências emergentes. Será assim tão difícil de entender?
8. Implementar ou incrementar o Espaço Lusófono de Ensino Superior (ELES) à imagem e inspiração do Espaço Europeu do Ensino Superior (EEES) e pelas razões que exprimi a quando do meu “Apelo”, em Luanda 2002, no Encontro das Universidades de Língua Portuguesa, que viria a ser designado como a Declaração de Luanda e esteve na génese da completamente esquecida Declaração de Fortaleza dos ministros da CPLP, razões que nunca será de mais relembrar: «A lusofonia real, que não cesso de proclamar como a única real via de afirmação de todos , insisto de todos os países e povos lusófonos, passa necessariamente e até primordial por aí ou não fosse a "educação de excelência para todos" o princípio e o motor insubstituíveis do desenvolvimento humano e não fosse a norma da "educação universal, obrigatória e gratuita" o programa mais revolucionário de toda a história moderna e válido para toda a Humanidade e não só para o mundo ocidental».
9. Criar, para ser convenientemente celebrado em todos os países e povos lusófonos, o “Dia da Lusofonia ou da Comunidade Lusófona”, que, da maneira menos polémica, poderia ser o dia da data da criação oficial da CPLP (17 de julho) e em que seria anualmente atribuído, conforme regras e regulamentos a definir, o Grande Prémio da Lusofonia, a personalidades ou instituições que se hajam notabilizado, em qualquer dos aspetos da atividade humana, na expressão e construção da Lusofonia, entendida como Comunidade Lusófona e incluindo também todas as diásporas lusófonas, lusótopas e lusófilas espalhadas pelas «sete partidas do mundo».
10. Instituir o Comité Desportivo/Esportivo da Comunidade Lusófona encarregado de dinamizar e organizar, com a grandeza e dignidade devidas, os Jogos da Lusofonia e tudo o mais que releve da atividade desportiva/esportiva dos países e povos lusófonos.
11. Até aqui tem-se passado o tempo a falar da CPLP e da lusofonia; o que verdadeiramente importa agora é começar a efectiva realização daquela que, desde há décadas, venho proclamando e tentando demonstrar como válida Tese Geral sobre a Lusofonia:
«Mais que projeto ou questão cultural e até linguístico-literária, a Lusofonia é, obviamente, um importante projeto ou questão de língua e, sobretudo, um importantíssimo projeto ou questão de Espaço Económico-Político próprio no globalizado mundo contemporâneo. O que também é válido para a CPLP, que deveria adoptar o nome menos antiquado e mais cairológico de União ou Comunidade Lusófona e que, em tempos de “globalização”, até poderia tornar-se paradigmático exemplo de uma grande e bem- sucedida Globalização.»
04/11/2010
Reitor da Universidade Lusófona do Porto.
Em http://www.ciberduvidas.com/lusofonias.php?rid=2250
1 comentário:
Seria interessante saber se este tal de Fernando Santos Neves teria coragem de me chamar, cara a cara, de «abencerragem», e ainda por cima «colonialista», por eu ser (tal como a maioria esmagadora dos portugueses) contra o Aborto... perdão, o «Acordo Ortográfico». Duvido que tivesse.
E, se tivesse, o mais provável era levar com, pelo menos, um estalo como resposta. Que tal para «tragicomédia»?
Muito degradado anda mesmo o panorama universitário português para ter uma criatura destas como «reitor». Não me admirarei se souber que é um «socretino» encartado. E faria melhor em ir para a Coreia do Norte ou para Cuba, onde, por não haver democracia, já se sabe que determinadas causas estão mesmo perdidas à partida.
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