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MIL: Movimento Internacional Lusófono | Nova Águia


Apoiado por muitas das mais relevantes personalidades da nossa sociedade civil, o MIL é um movimento cultural e cívico registado notarialmente no dia quinze de Outubro de 2010, que conta já com mais de uma centena de milhares de adesões de todos os países e regiões do espaço lusófono. Entre os nossos órgãos, eleitos em Assembleia Geral, inclui-se um Conselho Consultivo, constituído por mais de meia centena de pessoas, representando todo o espaço da lusofonia. Defendemos o reforço dos laços entre os países e regiões do espaço lusófono – a todos os níveis: cultural, social, económico e político –, assim procurando cumprir o sonho de Agostinho da Silva: a criação de uma verdadeira comunidade lusófona, numa base de liberdade e fraternidade.
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NOVA ÁGUIA: REVISTA DE CULTURA PARA O SÉCULO XXI

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"Trata-se, actualmente, de poder começar a fabricar uma comunidade dos países de língua portuguesa"

"Trata-se, actualmente, de poder começar a fabricar uma comunidade dos países de língua portuguesa"

Nenhuma direita se salvará se não for de esquerda no social e no económico; o mesmo para a esquerda, se não for de direita no histórico e no metafísico (in Caderno Três, inédito)

A direita me considera como da esquerda; esta como sendo eu inclinado à direita; o centro me tem por inexistente. Devo estar certo (in Cortina 1, inédito)

Agostinho da Silva

terça-feira, 18 de maio de 2021

António Sérgio a contra-luz



Ainda hoje, como procurámos demonstrar na nossa dissertação de doutoramento (Fundamentos e Firmamentos do pensamento português contemporâneo: uma perspectiva a partir da visão de José Marinho, Universidade de Lisboa, 2004), a visão simultaneamente mais fina e mais funda do pensamento português contemporâneo encontra-se em José Marinho, em particular na sua obra Verdade, Condição e Destino no pensamento português contemporâneo (1976).

Nessa obra, as passagens sobre António Sérgio não são muitas mas, em compensação, são muito elucidativas. Assim, fala-nos José Marinho, expressamente a propósito de António Sérgio, de um “razão judiciosa [que] toma o passo à razão compreensiva e elimina como erróneo ou falso o que é ou se lhe afigura obscuro ou vago, metafórico, hiperbólico, fantasioso ou inconsequente”, de um “exercício obsessivo da razão judiciosa sem conceito”.

Não obstante a sua “intuição radical, a sua promissora “intuição radical” – a intuição do “uno unificante”, nas palavras do próprio Sérgio: “Tal uno unificante é o verdadeiro ser. O Ser-Acto, por conseguinte, é o Eu espiritual, originário, puro de que são degradações – ou prefigurações longínquas – as consciências individuais de cada um de nós.” –, este nosso pensador nunca conseguiu, para o autor da Verdade, Condição e Destino no pensamento português contemporâneo, superar um conceito de razão que se cumpre na mera oposição, na mera cisão, não conseguindo, por via disso, realizar a “união cumulativa”.

Ainda nas suas próprias palavras: “Comparada com a de Pessoa, a situação de António Sérgio é paradoxal. Dir-se-ia, por um lado, que a sua personalidade está também, com o seu próprio pensamento, profundamente cindida entre a luz e a treva, devendo o que disse do seu directo antecessor aplicar-se como rigor maior a ele próprio. Antero de Quental, com efeito, tenta ainda a mediação na penumbra, António Sérgio, pelo contrário, cumpre-se na oposição da luz e da treva, do branco e do negro, da verdade e do erro, do bem e do mal.”. Em suma, nesta visão, Sérgio seguiu a “via extrema do humanismo”, da “imanência da verdade no homem”.

Numa visão outra, que Manuel Ferreira Patrício qualificou como “muito benevolente para com António Sérgio”, Eduardo Abranches de Soveral ensaia uma outra perspectiva sobre António Sérgio – fá-lo, em particular, na sua obra O Pensamento de António Sérgio: síntese interpretativa e crítica.

Aí, chega mesma a considerar que “ao contrário do que poderia supor-se, Sérgio não foi agnóstico. Há mesmo no seu pensamento uma forte e emotiva componente religiosa” – começando por citar, em seu abono, a seguinte passagem dos Ensaios: “Em mim (…) há um racionalismo radical que tem o seu quê de místico, de vida unitiva”.

Citando ainda outras passagens – em que Sérgio alude à “união com princípio supremo, pensamento absoluto e impessoal”, ou à “Unidade da consciência humana” –, Eduardo Abranches de Soveral chega mesmo a considerar que António Sérgio, “à sua maneira, como que subscreve a afirmação agostiniana de que Deus habita no interior do homem”, ressalvando, porém, que “para um melhor esclarecimento das posições religiosas de Sérgio (…) convirá fazer uma breve referência à forma como se situou perante o Cristianismo”.

Nesse plano, salienta a tese de que, para Sérgio, o Deus do cristianismo é “o primeiro Deus que é já concebido com uma dose suficiente de racionalismo”, citando ainda esta eloquente passagem: “Ao que suponho, a Europa só terá uma religião europeia (…) quando virmos no Cristianismo a religião do Espírito, adoradora portanto de um Deus do Espírito – situado , adentro de nós – e concebido pela inteligência e pelo puro amor”.

As consequências que António Sérgio retira desta concepção de divino parecem, contudo, cingirem-se sobretudo ao plano ético-político, chegando mesmo a escrever que “os corolários sociais da doutrina cristã são de extrema esquerda; e se há católicos de direita, são-no pela mais rotunda infidelidade ao Evangelho”. Ou seja, em suma: ao contrário do que acontece, por exemplo, em Marinho, a concepção do divino em Sérgio não parece produzir qualquer inquietação metafísico-escatológica, antes, tão-só, ético-política, em que, de resto, o valor maior é o da igualdade, não o da liberdade, como nota Eduardo Abranches de Soveral.

Em contra-luz, sugere Manuel Ferreira Patrício “que se deve levar mais a sério o facto de António Sérgio ter nascido em Damão e ter sofrido uma influência materna provavelmente hinduísta, ou budista. Nesta perspectiva, já faria outro sentido a noção de um ‘Eu absoluto inconsciente’, como mais sentido faria o interesse de Sérgio por Antero de Quental, atrás do qual se encontra Eduardo de Hartmann (…). É o impersonalismo sergiano, para que nós chamámos a atenção em 1984” – no seu ensaio A fundamentação filosófica da educação em António Sérgio, em que analisa Sérgio de uma forma a nosso ver ainda hoje insuperada.

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