Volta e meia, alguém levanta a questão: quem nos poderá salvar? As más
questões, porém, nunca, ou apenas raramente, dão azo a boas respostas. É, de
modo exemplar, o caso desta.
Desde logo, porque, pelo menos de forma tácita, espera “de fora” algo
que só poderá emergir “de dentro”. Eis o primeiro equívoco que importa
desmontar, de forma peremptória: Portugal não poderá ser “salvo” a partir de
fora, mas apenas a partir de dentro. Enquanto esperarmos sermos salvos a partir
de fora, não há, de todo, salvação possível.
Obviamente, não significa, isso, um regresso à posição de
“orgulhosamente sós”. Ao longo da sua já bem longa história, Portugal sempre
estabeleceu alianças. Neste mundo cada vez mais globalizado, essas alianças são
ainda mais vitais.
À partida, há duas grandes alianças geo-estratégicas: a europeia e a
lusófona. Que não são, também à partida, excludentes entre si. Bem pelo
contrário – como temos dito, a nossa inevitável entrada na então Comunidade
Económica Europeia teria sido fortalecida se Portugal não tivesse desprezado,
ao longo das últimas décadas, a aliança lusófona. Assim, entrámos como um país
pequeno e mantivemo-nos com um parente pobre da Europa.
O resultado está bem à vista de todos: Portugal é hoje um país-mendigo,
sujeito às maiores humilhações. O nosso próprio Governo responde em primeiro
lugar perante instâncias externas – não perante o povo português. Daí, de
resto, essa tentação de considerar que a “salvação” só poderá vir de fora: se
nos minorassem ou perdoassem os juros, se nos minorassem ou perdoassem a
dívida, se nos dessem mais dinheiro, etc.
É certo que algo tem que ser feito nessa frente, e que, para tal,
Portugal deve promover uma aliança privilegiada com os restantes países do Sul
da Europa – com aqueles que estão numa situação análoga à nossa. Mas não
tenhamos ilusões: a União Europeia corresponderá sempre, sobretudo, aos
interesses dos países mais fortes da Europa. Nunca houve nem jamais haverá real
paridade entre os diversos parceiros europeus. A diferença é que, no tempo da
pujança económica, essa hegemonia do Norte da Europa era pouco sentida – ou até
sentida de forma favorável. Agora, em tempo de penúria, também essa ilusão de
esboroou.
De nada vale pois clamar por uma paridade entre os parceiros europeus.
Os países do Norte da Europa só manterão a União Europeia e a moeda única
enquanto isso corresponder aos seus interesses. Esperar o contrário será
persistir numa ilusão que nos tem sido fatal. Já para não falar do fantasmático
“federalismo europeu” que, amiúde, reemerge como a panaceia para todos os
nossos males. Ele só iria acentuar a subalternidade da nossa posição, apesar do
que (ainda) dizem muitos dos nossos políticos e “comentadores”, em todos os
jornais e televisões.
Em suma, podemos pois concluir que a nossa “salvação” jamais virá da
aliança europeia. Mas também não virá, no imediato, da aliança lusófona. A
nossa “salvação”, reiteramos, só poderá vir de dentro, de nós próprios. Tal
como a culpa da situação onde chegámos é sobretudo nossa, também a salvação
terá que vir sobretudo de nós. Ou seja, Portugal terá que procurar ser o mais
auto-sustentável que lhe for possível – e só a partir daí é que deve tirar
partido das suas alianças estratégicas. A médio-longo prazo, a aliança lusófona
será, sem dúvida, como cada vez mais vai sendo reconhecido, aquela que melhor
garante o nosso futuro, aquela que mais fortalece a nossa posição no mundo,
inclusive no espaço europeu. Assim haja visão.
Renato Epifânio
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