A província de Maputo voltou a ser palco de protestos violentos na manhã de quinta-feira. O recomeço da cobrança de taxas na polémica portagem da concessionária sul-africana Trans African Concessions (TRAC), entre as cidades de Maputo e Matola, levou os cidadãos às ruas, resultando no bloqueio das principais vias de acesso à capital.
Manifestantes utilizaram barricadas, pneus incendiados e veículos atravessados nas estradas para interromper o tráfego, numa demonstração de descontentamento com a medida.
Em entrevista à DW, o analista político Xavier Nhanala afirma que a resposta popular veio confirmar as suspeitas de que a paz ainda não é uma realidade em Moçambique e que os protestos reflectem o descontentamento crescente do povo com medidas que considera injustas e com uma governação marcada pela falta de diálogo e transparência.
Deutsche Wwll (DW): Como descreveria o ambiente nas primeiras horas desta manhã nas imediações da portagem de Maputo? Quais foram os sinais iniciais de que os protestos seriam inevitáveis?
Xavier Nhanala (XN): Passei pela portagem da TRAC, eram pontualmente 5 horas e 57 minutos, em direcção a Boane. Enquanto passava por ali, obviamente bem antes mesmo de chegar ali, estava na zona da Maquinag. O que procurei fazer foi prestar muita atenção, perceber se era possível passar, se havia escaramuças ou não, porque esta é uma coisa que já prevíamos que pudesse acontecer.
A situação estava aparentemente calma, mas na portagem mesmo havia um contingente policial. A polícia da UIR estava lá a preparar-se, obviamente, para começarem com as cobranças na portagem. Mas, eu passei, antes mesmo de começarem a cobrar. Pelas 12 horas, vi que já estavam a cobrar. Acho que levaram uns 30 minutos a cobrar. Aquela população ao redor da portagem, Casa Branca-Trevo e Maquinag começou a arremessar pedras e a queimar pneus. Pelo menos é assim que este povo tem se manifestado quando o seu apelo não é ouvido.
DW: Esta é a confirmação do que se suspeitava: que a paz que se vive no momento é uma paz frágil?
XN: Pois, é uma paz frágil e aparente, porque a verdade é que não estamos em paz. Não estamos em paz. O que acontece é que as pessoas estão a circular de forma normal, mas no seio de cada moçambicano há uma dor muito enorme. Primeiro, por estar diante de um Governo que já nasce morto. A própria investidura do actual Presidente da República foi um autêntico fiasco, enquanto tomava posse, havia pessoas a morrer, pessoas a serem esbofeteadas pela Polícia da República.
E a situação que vivemos neste momento é essa: é uma paz aparente. Eu quero acreditar que a TRAC também estava mesmo a experimentar, para ver o que podia acontecer, porque não demorou e logo cancelou as portagens. É uma situação que já prevíamos e sempre dissemos que Moçambique nunca mais seria o mesmo diante desta situação pós-eleitoral que nós estamos aqui a viver.
DW: Está claro para todos que o povo moçambicano “abriu o olho”, como se diz na linguagem popular. Este caso de hoje confirma que o moçambicano nunca mais se vai conformar com aquilo que considera injusto na governação?
XN: Nunca mais, nunca mais. O povo moçambicano nunca mais vai se vergar diante desta situação. E pior: antes mesmo desta situação toda, o autoproclamado presidente do povo, Venâncio Mondlane, já havia feito uma reportagem, bem mesmo ali na ponte, depois da portagem da TRAC, a dizer que a TRAC queria que se pagasse aquela portagem por 30 anos, mas, em menos de cinco anos, a amortização já estava totalmente paga.
Então, essas cobranças que estão a acontecer neste momento são ilícitas e nós não sabemos se realmente vão para a TRAC ou para o bolso de alguém, não entendemos. E também como é que a TRAC aparece a dizer que vai continuar a fazer as cobranças, se em nenhum momento disse que estava parada sem fazer as cobranças? Esta é a questão que mais girava em torno das redes sociais.
Voltou-se a ouvir o hino nas ruas de Maputo
O hino de Moçambique voltou a ser entoado por centenas de populares em diferentes ruas do centro de Maputo, em resposta ao apelo do ex-candidato presidencial Venâncio Mondlane, terminando ao fim de 15 minutos, sem incidentes. Entre a avenida Guerra Popular e a baixa da cidade, vários grupos juntaram-se, à hora prevista – 13:00 locais e, de mãos dadas, com bandeiras, vuvuzelas e apitos, cantaram o hino, pacificamente, perante um trânsito bloqueado, durante 15 minutos, uma forma de contestação que marcou os protestos pós-eleitorais sobretudo em Dezembro. “Venâncio Mondlane indicou-nos para cantar o hino nacional todas as sextas-feiras”, explicou, enquanto Filipe Alberto, que repetidamente cantou o hino durante os 15 minutos, acrescentava: “É sobre o país, está muito mal (…) roubaram os votos”. E enquanto os restantes alternavam o hino com buzinadelas e tudo o mais que fizesse barulho, Filipe Alberto acrescentava: “Se não entregarem, isto aqui nunca vai parar”. In “Jornal Tribuna de Macau” – Macau com Nádia Issufo “Agência Deutshe Welle”
Sem comentários:
Enviar um comentário