Que coração de mulher não se renderia a elas!
Até o meu tempo de namoro ainda se faziam serenatas; não aquelas suntuosas do século passado com muitos instrumentos e cantores de voz de veludo,pagos a peso de ouro por apaixonado desentoado e rico;este,limitava-se a carregar as rosas vermelhas da paixão,que,com boa pontaria,atirava á janela da amada.
Se era correspondido e esperado, a bela abria a janela e aparecia esplendorosa no seu pegnoir de rendas e sedas,beijava a rosa enviada e devolvia ao amado,cheia do seu calor.Se era malvisto,a janela fatal continuava fechada e o infeliz e seus músicos recebiam na cabeça as bacias de água de gasto e os xingamentos do dono da casa ou dos vizinhos,sujeitos pouco dados á romantismo.
Meu namorado de então, depois marido,sempre fazia serenatas;sempre ele a cantar,embora tivesse uma voz de taquara rachada e mais uns dois violões e cavaquinhos,amigos de copo e da pulha.Invariavelmente,cantava a” Malandrinha”,forcejando no estribilho que eu adorava:
“Ó linda imagem de mulher que me seduz
Se eu pudesse te poria num altar.
És rainha dos meus olhos, és a luz;
És malandrinha, não precisas trabalhar!”
Quando chegava no “acorda minha bela namorada”,meu pai,velho sertanejo mais dado a filosofias do que a amores e sujeito de sono leve,acordava e tirava a bela da sacada,com medo de que a sua Rapunzel,enfeitiçada pela música,jogasse as tranças.
A serenata, deste sábado , parava por aí.Sem flores,nem beijos.
Um cancioneiro pernambucano,assim escreveu:
Quem ama, para dar provas
Deve três cousas cumprir:
Tocar violão, fazer trovas,
Noite de lua, não dormir!
Todos os povos do mundo fizeram serenatas;cantar e louvar o seu amor era “direito consuetudinário” e milenar.Até algumas tribos indígenas norte-americanas,faziam,ao som de flautas;os romanos,segundo Horácio,aderiram ao costume,cujos cantos,os gregos chamavam “paraclausithyron”.
Estas eram as serenatas de amor;mas,havia ,também,as de agradecimento e admiração;os homenageantes,percorriam as ruas,em bandos,até a casa do homenageado,que deveria estar toda fechada e,só depois da primeira cantiga,a casa se iluminava e as janelas se abriam.
Um exemplo:
A Europa curvou-se ante o Brasil
E aclamou parabéns em meigo tom;
Brilhou lá no céu mais uma estrela:
Apareceu Santos Dumont.
No Rio,a cidade de Conservatória ainda persiste no belo costume das serenatas.Elas marcam,sim,a vida da gente;tanto,que,quando for ao Rio,em Setembro,para a Bienal,visitarei esta cidade,com o intuito de ouvir serestas;e,pedirei para cantarem a “Malandrinha”;tem que ser numa noite de lua cor de prata...
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