terça-feira, 29 de dezembro de 2009

O suplício físico de Jacques de Molay

O suplício físico de Jacques de Molay, impotente para produzir nenhum resultado mais que baixamente material, desencadeou sobre a Igreja as forças mágicas que essa acção material era incompetente para dominar, servindo só para as desencadear. E o pior foi que o processo de imolação fosse pelo Fogo, isto é, pelo Elemento da Ordem. Assim, para falar um pouco obscuramente, o que era Adepto Exempto, em vez de passar a Mestre do Templo, foi erguido a Mago, e, apto a pronunciar a Palavra da Era, pronunciou-a como Irmão Negro, e contra a Igreja. Toda a civilização moderna, desde a Reforma aos nossos tempos, no que é oposição à Igreja e conspurcação dela e dos seus princípios, é a vingança encarnada de Jacques de Molay. A fogueira em que foi queimado o Grão-Mestre dos Templários foi o lume que ateou o incêndio em que hoje todos ardemos.
Num ponto, porém, a vingança de Molay, operando por vias inferiores, caiu no mesmo erro em que haviam caído os seus algozes. Foi quando D. Sebastião, AE [Adepto Exempto], foi feito cair em Alcácer Quibir. Caiu pela espada, isto é, pela Terra, e o erro foi o mesmo que o de fazer Molay cair pelo Fogo, porque de igual natureza. No mesmo modo o Adepto Exempto ascendeu a Mago, queimando o grau intermédio, e pronunciou, no tempo dado, a Palavra da Era seguinte.
[actualizámos a ortografia]

Fernando Pessoa, Subsolo (espólio 54-93) in Fernando Pessoa e a Filosofia Hermética – Fragmentos do espólio, introdução e organização de Yvette K. Centeno, Ed. Presença, Lisboa, 1985, p. 43.

1 comentário:

CARO/A VISITANTE, CONTRIBUA NESTA DEMANDA. ACEITAREMOS TODOS OS COMENTÁRIOS, EXCEPTO
OS QUE EXCEDAM OS LIMITES DA CIVILIDADE.

ABRAÇO MIL.